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sábado, 23 de fevereiro de 2013

De que vale o Oscar para o Cinema?

....e eis que chega aquela época do ano em que todo mundo entende de cinema! É tempo de Oscar! É brega, é injusto, todo mundo diz que não liga mas, no final das contas, fica doido para assistir os indicados e vencedores, os perdedores e os subestimados. Entra ano sai ano, sempre haverá para cada 'Um Estranho no Ninho' um 'Shakespeare Apaixonado', para cada Jack Nicholson um Roberto Benigni subindo nas poltronas e por aí vai.

   Mas é uma festa da convenção: vale o 'tema' do ano, o 'zeitgeist' do momento. E isso vai ao largo de qual filme realmente presta. Nunca esqueço uma entrevista em que Woody Allen diz que jamais poderá acreditar em Oscar (ele próprio vencedor por Annie Hall), porque não é uma competição como atletismo, em que você efetivamente vê o vencedor cruzando a linha de chegada. Morro de rir pensando nisso. E no campo artístico, quem pode dizer o que é melhor que o que? É tudo questão de semântica, diria o pensador.

Visto assim, e só assim, o Oscar é sim, importante para o cinema não só americano, mas para o interesse mundial por cinema, nem que seja começando com um interesse pelo cinema estadunidense e eventualmente evoluindo para uma opção por outras cinematografias, ao gosto do freguês.

Se um desavisado que raramente vê filmes assistir apenas a essa seleção de nove filmes escolhidos pela Academia esse ano, tenho que dizer: ao menos, ele estará em boas mãos. Tirando as esnobadas assassinas (O Mestre, veja crítica no post anterior e assista esse grande filme pelamordedeus), a seleção de 2013 foi um mistura decentíssima de bons filmes com grandes filmes. Nada ficou sobrando; é tudo digno ao menos.

Argo, de Ben Affleck, é um ótimo suspense com trama baseada em fatos históricos, e até o momento pinta como favorito. É um thriller em que o papel de Hollywood é exaltado num contexto político, e isso aliado à cada vez maior habilidade de Affleck atrás das câmeras com certeza atraiu a atenção dos votantes da academia. Um filme tenso e honesto, de storytelling direto, como os acadêmicos gostam. Um ótimo filme.

A Hora Mais Escura, filme de Kathryn Bigelow sobre o caçada humana a Osama Bin Laden é uma fita difícil e emocionalmente fechada, quase o oposto do seu vencedor de Oscar anterior, The Hurt Locker.
Mas tem uma performance poderosa de Jessica Chastain e um meia hora final de trincar o maxilar. No máximo foi lembrado pelo tema relevante e pela atriz. Bigelow não é genial, mas tem seus momentos na condução da tensão e no retrato imparcial, na medida do possível, dos acontecimentos pós-11 de Setembro.

Os Miseráveis, adaptação musical do romance de Victor Hugo, é uma fita digna, mas é impossível segurar a impressão de que o diretor Tom Hooper é um embuste...eu penso isso desde sua vitória pelo superestimado O Discurso Do Rei, mas acho que agora fica claro para um grande público que se trata de um diretor limitado, correto porém medíocre, conduzindo um elenco excepcional (Russell Crowe não sabe cantar, Hugh Jackman competente, a sempre linda e talentosa Anne Hathaway) num filme que nunca alcança a grandiosidade, mas que vale a sessão. Fica apenas um senão: academicismo demais estraga até a mais reverente das obras...é preciso renovar a linguagem para se comunicar com o grande público.

Lincoln é o triunfo de um Steven Spielberg solene, pretensioso, emocionado mas não emocionante e, principalmente, tecnicamente perfeito. Desde a reconstrução de época irretocável e discreta (o filme passa-se quase todo dentro de gabinetes, não há praticamente cenas de guerra), passando pelo roteiro equilibrado de Tony Kushner e culminando na atuação e caracterização soberba de Daniel Day-Lewis, a sensação que fica ao final é de um filme que cumpre seu objetivo entregando ao público uma fatia histórica satisfatória (no caso, a votação da emenda que levou ao fim da escravidão a ao posterior final da Guerra Civil nos EUA), embalada pela direção competente de Spielberg e um show de atuação de Day-Lewis e veteranos como David Strathairn, e principalmente o fabuloso Tommy Lee Jones como o abolicionista Thaddeus Stevens. Não sei se Lincoln é um filme que irá melhorar ou piorar numa revisão, mas por agora, achei imensamente satisfatório.

Indomável Sonhadora (no original, Beasts of Southern Wild), é um aceno da academia para um cinema independente e preocupado com causas sociais. A história de uma garotinha ( a estreante mais jovem á ser indicada a um Oscar, a pequena Quvenzhané Wallis) que vive num mundo próprio junto ao seu pai , rodeada por uma Nova Orleans devastada pós-furacão Katrina, tem na sua indicação a melhor filme seu maior elogio. Ponto para a Academia pela indicação do filme, pois mesmo que não ganhe prêmios, já terá a oportunidade merecida de alcançar um público maior. Uma bem vinda mistura de realismo fantástico com denúncia social, marca a estréia de Behn Zeitlin na direção. Merece ser descoberto.

E muito bem-vinda é a volta do eclético diretor chinês Ang Lee à direção com um belíssimo filme, As Aventuras de Pi. Uma aventura com tons filosóficos baseada na obra de Yann Martel, Pi é um obra de imenso poder estético, e junto com Hugo Cabret de Scorsese é uma das únicas a explorar corretamente o potencial do 3D no cinema moderno. Se ganhar prêmios técnicos, será merecidíssimo. Mas não creio que a Academia se dobrará ao sucesso mundial desse diretor que já fez obras tão díspares quanto O Tigre e O Dragão, Brokeback Mountain, Tempestade de Gelo e Hulk. Fica a curiosidade em saber qual será o próximo passo do sempre competente Ang Lee.

Outro grande destaque entre os indicados, e possivelmente o melhor filme entre os concorrentes, é Amor, do diretor austríaco Michael Haneke. Conhecido por filmes espetaculares e difíceis como a Professora de Piano, Violência Gratuita e A Fita Branca, aqui Haneke conta a derradeira história de vida e morte de um casal apaixonado encarando a velhice, o último desafio do amor consumado, da memória afetiva, da vida à dois. Uma obra-prima difícil de se esquecer, graças às performances superiores de Emmanuelle Riva (Indicada a Melhor Atriz) e Jean-Louis Tringnant. E um triunfo de Haneke, que finalmente vê seu cinema sendo reconhecido mundialmente fora do circuito de Cannes, onde sempre foi premiado.

Mas se a conversa é sobre palpite e favoritismo, a despeito da qualidade de cada filme, meus dois favoritos são O Lado Bom da Vida e Django Livre, ambos produzidos pelo über-midas de Hollywood Harvey Weinstein, que desde os anos 90 com sua Miramax consegue emplacar Oscar após Oscar suas produções. O Lado Bom da Vida é uma comédia dramática com toques setentistas como há muito não se via...algo na linha de Melhor é Impossível ou Um Estranho no Ninho...um filme cuja força reside no elenco afiado e na direção humanista e discreta de David O. Russell, autor de grandes obras como Três Reis, O Vencedor e Huckabees.

 E Django Livre, como todo mundo já sabe, é mais uma obra de Quentin Tarantino destinada à grandiosidade. Um Western Spaghetti (ou Southern, como bem disse o escritor/diretor) com todas as marcas registradas de Tarantino: roteiro perfeito, grandes momentos de ação e um senso épico grandiloquente como  há muito não víamos numa sala de cinema. Se a prova de autenticidade for a prova da sala de cinema, então Django deveria ser o grande vencedor: em todas as sessões que compareci, a platéia reage ao filme extasiada, e sai com a sensação de refeição completa, coisa que só os grandes filmes são capazes de proporcionar. Muito provavelmente Django não levará muitos prêmios, mas é meu filme predileto entre os concorrentes. E só a alegria de ver entre os indicados um filme cheio de vida, da autoria de um transgressor como Quentin Tarantino, já vale a festa.

Se você gosta ou não de Oscar, isso é outra história, e plenamente justificável. Mas se você gosta de cinema, uma safra variada e cheia de qualidades como essa não pode passar batida. Sem medo de parecer político, mas nós cinéfilos, dessa vez, somos os vencedores.    

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Duro de Matar: Um Bom Dia Para Morrer (A Good Day to Die Hard, dir. John Moore, EUA, 2013, 97 min.)

 E aqui estou eu, meus amigos, após uma sessão de Duro de Matar - Um Bom Dia Para Morrer. Tenho boas e más notícias...as boas são que o filme tem ritmo ininterrupto, ótimas sequências de ação, e o velho John McClane está sim de volta, bem melhor do que eu previa. Bem superior ao episódio anterior. As más notícias, bem....está longe de ser um filme perfeito; tem falhas graves, gravíssimas. Mas é uma fita perfeitamente passável e afinal de contas, é um filme honesto da série Duro de Matar ao menos.

O plot é muito simples e insere na mitologia da série o filho de John McClane, Jack, que está na Rússia trabalhando para a CIA como um infiltrado. Cabe a ele escoltar um preso político( Sebastian Koch, de A Vida dos Outros), inimigo do governo, para fora do país, onde este revelará um dossiê que colocará em xeque todo o esquema político vigente, segredos que remontam até ao acidente nuclear em Chernobyl. McClane, nos EUA, recebe a notícia de que esse filho-problema foi preso (na verdade um estratagema para retirar o preso político da prisão e do tribunal onde será julgado), e vai à Russia num misto de curiosidade sobre o filho e viagem de férias. Sem mais, nosso azarão favorito é pego no meio de um incidente que vai levá-lo para mais uma saga de sangue, suor e bala, muita bala.

 A relação entre McClane e seu filho é apenas esboçada, porque esse é um filme relativamente curto, (97 min.) que dispensa recordatórios e apresentações. A ação se desenrola desde o primeiro frame, e não há muito espaço para desenvolvimento de personagens. Seja como for, nesse filme Bruce Willis faz um McClane muito mais afinado com os filmes iniciais da série, bem-humorado e com soluções insanas para sequências virtualmente inescapáveis de ação. Isso foi muito acertado. Apesar de ser um McClane mais durão e invencível, ainda é aquele mesmo personagem dos filmes iniciais, e isso foi acertado. O tom do filme tem muito mais à ver com Duro de Matar do que o filme anterior.

 Infelizmente no início do filme Willis praticamente corre atrás da trama, tentando se inserir no contexto do que está acontecendo. Da metade em diante., toma as rédeas e passa a interferir diretamente na ação. O roteiro de Skip Woods é prodígio em criar grandes cenas de ação, mas fraco em reviravoltas. Não vai muito além disso. O que fica é o talento do diretor John Moore em armar junto com sua segunda unidade grandes cenas de ação, que desde já entram para o cânone das grandes sequências da série.

  E isso é Duro de Matar - Um Bom Dia Para Morrer, um filme de ação com alguns grandes momentos que procura respeitar como pode o estilo e a mitologia da série, mas que aqui e ali tomba graças à um roteiro simplório e a própria percepção do público moderno do que deve ser um filme de ação. A grande verdade é que McClane ainda é ardiloso e luta contra a overdose de CGI e coadjuvantes fracos que lhe empurram a cada filme. Mas é sempre satisfatório vê-lo superando esses problemas e quem sabe, pronto para mais uma aventura. Se esse é o James Bond de New Jersey, ele pode e deve sempre voltar. Yippee Ki Yay, pessoal. E no final ainda com 'Doom and Gloom', a nova canção dos Stones. Poxa, nem dá pra reclamar. Até a próxima, McClane.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Duro de Matar 4 (Live Free or Die Hard, dir. Len Wiseman, EUA, 2007, 124 min.)

Quase doze anos após o terceiro, Duro de Matar 4 viria para estragar o legado da série. Apesar de sucesso de bilheteria e curiosamente de crítica, qualquer fã da série sabe apontar que esse é um filme com um objetivo claro: faturar em cima da franquia com uma obra burocrática ainda que decente, em que todas as características reconhecíveis da série foram apagadas em favor de 'reimaginar para uma nova geração' (como eu odeio isso) um 'novo conceito' (odeio mais ainda isso) sobre Duro de Matar.

 O triste é pensar PORQUE um estúdio como a Fox desrespeitou tanto as convenções da série e COMO Bruce Willis topou uma roubada dessa. Mas enfim. Vamos aos detalhes sangrentos.

No interim entre Duro de Matar - A Vingança e este Duro de Matar 4 o mundo mudou bastante. Principalmente as comunicações, notadamente a internet, e os sistemas de segurança após o 11 de Setembro. Jamais McClane teria de correr a um telefone público, ou terrorismo seria a desculpa para um grande roubo. Em certo momento é dito a McClane: "Você é um relógio Timex numa era digital.", e isso é verdade. Ainda assim é uma metáfora idiota, já que a Timex faz relógios digitais há décadas. Mas um sentimento é válido: teria McClane se tornado uma relíquia? Essa questão jamais é respondida porque o filme é fraco, Willis está claramente no piloto automático e graças a uma censura mais branda, toda a violência, o humor negro e a ousadia de Duro de Matar se foram em troca de um filminho de ação coalhado de CGI e seguro para a família toda se divertir. Yippee Kay Yay!

 Desta vez, o policial precisa proteger um hacker (Justin Long, um péééssimo sidekick para McClane, que aliás NÃO precisa de sidekicks...a química entre os dois não rende UMA piada decente em duas horas de filme. Pense nisso.) que pode ajudar os Estados Unidos - o feriado de 4 de julho está aí e um grupo terrorista cibernético atacou as redes de comunicação do país, gerando um colapso nacional nos sistemas do governo. A suposta devastação da Casa Branca e a reversão do dinheiro do seguro social de todos os trabalhadores do país para uma conta privada estão entre as muitas ameaças que McClane vai tentar impedir.

 Aliás, tentar não. Nesse filme infelizmente testemunhamos a transformação de John McClane numa entidade praticamente indestrutível, num super-homem que vocifera frases de efeito e não perde uma briga. Isso não é a essência do personagem, isso é uma paródia de todos os heróis de ação que Willis interpretou durante sua carreira. Devo dizer que o McClane real, aquele dos filmes anteriores, vulnerável e sempre com um plano absurdo, sempre comendo pelas beiradas, desacreditado pela polícia e pela família, não dá as caras aqui. Aliás, apenas no começo do filme vemos a interação dele com sua filha, Lucy Gennaro (Mary Elisabeth Winstead, linda e mal-aproveitada), e aí dá realmente a impressão de que vai ser um filme digno da série, mas em vão. Depois cai tudo na vala comum do filme de ação da semana. Um herói indestrutível, previsível, e um vilão também previsível e frouxo, inundados por um roteiro ruim e muito efeito especial. Timothy Olyphant faz o vilão Gabriel, talvez um dos vilões MENOS AMEAÇADORES da história recente dos filmes de ação. Muito, muito fraco.

 Mas o responsável por isso tudo é o 'diretor' Len Wiseman, um desses pau mandados de estúdio que simplesmente não conseguem fazer nada direito além de deixar tudo pra segunda unidade de cenas de ação. Desde o início de carreira, com a série Anjos Da Noite, Wiseman já mostrava sua inclinação: filme de ação/ficção derivativo e medíocre, copiando tudo o que já foi feito antes, e melhor. Aqui ele dirige com reverencia de fã, mas sempre à distância. Ao contrário da mão firme de John McTiernan, a impressão que esse Duro de Matar 4 passa é a de que Wiseman dirigiu o filme sentado no sofá em casa, enquanto assistia os filmes anteriores da série. Simplesmente não há direção aqui. O filme praticamente se conduz rumo à um final correto e anticlimático. Mais uma vez pergunto: será que não tinha um John Woo, um Phil Alden Robinson (que fez em 2004 A Soma de Todos os Medos, um filmaço com a pegada de John McTiernan) disponível não? Um diretor de ação de verdade?

  A verdade é que deu dinheiro, a crítica caiu no truque e gostou. Acho que o sucesso desse filme tem a ver com a própria percepção moderna do que é um filme de ação. Hoje em dia o que faz sucesso não são os heróis dos anos 80, e sim os heróis dos anos 80 se parodiando, como bem provou Stallone em Os Mercenários. Mas Willis tem mais talento que isso, a série merecia mais, e os estúdios nunca ganharam tanta grana sendo cínicos em relação ao seu público.

  Duro de Matar 4 desrespeita os fãs da série com um filme banal que perverte a essência da série. Que venha o quinto filme amanhã, ainda que os prognósticos vindos do exterior, onde já foi lançado, não sejam animadores. Será McClane uma relíquia que deveria ser abandonada na metade dos anos 90? Veremos.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Duro de Matar - A Vingança (Die Hard with A vengeance, dir. John McTiernan, EUA, 1995, 128 min.)

 E posso dizer com alguma certeza que Duro de Matar - A Vingança é o sucessor legítimo em estilo e verve  do filme original. Uma fita ousada, violenta, com senso de humor negro e ação insana, que nunca te deixa prever o que vem a seguir. Diferente do segundo episódio, este Duro de Matar ao invés de copiar elementos de roteiro do primeiro filme, pega o espírito do original e joga tudo numa nova perspectiva, mais abrangente ainda. Aqui a fórmula sofreu um abalo positivo e o que temos é um filme cuja ação se desenrola por toda Nova York. Mas nosso chapa John McClane continua o mesmo, bonachão, casca-grossa e bem-humorado.

 O vilão da vez é Simon (participação caprichadíssima de Jeremy Irons) , um maníaco por bombas que ameaça explodir pontos importantes da cidade caso McClane não atenda suas exigências sádicas. O porquê dele escolher McClane e o porquê de seu plano estapafúrdio são reviravoltas espetaculares de roteiro, que não vou mencionar aqui para não estragar a surpresa. Vale a regra: se você gosta de ação a ainda não viu esse filme, corra que vale muito. Um dos grandes dos anos 90.

 Dessa vez McClane tem um parceiro em cena, Zeus, (Samuel L.Jackson) líder comunitário do Harlem que logo no início da fita se vê envolvido junto com o policial na cadeia de eventos desencadeada por Simon. O mais bacana da relação entre Willis e Jackson é que em momento algum eles se tornam amigos ou  coisa do tipo. Longe de ser um carbono dos buddy cop movies como Máquina Mortífera e 48 Horas, esses dois personagens apenas estão unidos brevemente por uma questão de sobrevivência, e o humor que surge desse desespero gera grandes momentos de humor na tela.

 E assim Mc Clane e Zeus cruzam Nova York seguindo as exigências absurdas de Simon, enquanto descobrem um plano maior, ousado, que deve muito ao filme original. A essência de Duro de Matar está no fato de que é um jogo de gato e rato: sempre que McClane descobre o suposto plano do vilão, este já está dois passos adiante, e isso é emocionante. Esse filme é sábio em resgatar esse sabor de que tudo pode acontecer, até o final.

  A cereja no bolo é o retorno de John McTiernan à direção de Duro de Matar. Ele prova aqui que o sucesso da série não reside apenas na performance de Willis; é a força de sua direção e o entendimento de que o humor muito bem colocado entre sequências ambiciosas de ação fazem da série algo único. Apenas McTiernan compreendeu o que é Duro de Matar: uma mistura única de faroeste moderno com filme de assalto e fita-catástrofe. Considero esse o final da série em termos de qualidade. Quem dera os outros diretores da série entendessem o espírito da coisa. Infelizmente isso não aconteceu e tivemos depois Duro de Matar 4, que eu comento amanhã. Yippee Kay Yay, pessoal.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Duro de Matar 2 (Die Hard 2, Dir. Renny Harlin, EUA, 1990, 124 min.)

 E com o sucesso de crítica e principalmente comercial do primeiro, chegamos a esse Duro de Matar 2, praticamente um carbono do Duro de Matar original, substituindo a ambientação do Nakatomi Plaza para um Aeroporto em Washington, também no dia de Natal.

 Desde a cena inicial, nosso amigo John McClane está até o pescoço num dia de cão. Seu carro está sendo rebocado na entrada do aeroporto num dia de inverno pesado. Ele está esperando o desembarque da sua eterna mulher, ou ex-mulher, Holly Gennaro. Mas a chegada dela e de todos os outros aviões vai ser atrasada quando o aeroporto é tomado pelo Coronel Stuart (William Sadler, um psicopata mascote de Hollywood), no intento de libertar o Barão das Drogas General Ramón ( o Django original, Franco Nero), que está chegando do exterior num vôo sob custódia. Desta vez, os passageiros e os aviões no céus são os reféns, e cabe a McClane bagunçar o coreto e acabar com esses vilões.

E daí em diante, o diretor Renny Harlin (hoje decadente em Hollywood e um cineasta de ação que não deu muito certo, tirando um ou outro acerto aqui e ali) entrega um Duro de Matar que segue a cartilha do primeiro com atenção e algum carinho com a fórmula. McClane continua boa praça e teimoso, durão e piadista; sempre há um policial espírito de porco que zomba e desafia ele (aqui Dennis Franz de NYPD Blue faz o capitão Carmine Lorenzo, uma pedra no sapato de McClane, ou vice-versa); e as reviravoltas são muitas e inesperadas, às vezes até inverossímeis, mas tudo muito divertido como convém num blockbuster dessa estirpe.

Harlin entrou sabendo que seria impossível recriar o impacto do primeiro Duro de Matar, mas foi sábio em replicar os elementos que fizeram do anterior um grande filme. Pena que esse segundo episódio nunca alcança ou supera a ação, o humor e o ritmo do seu predecessor . Bruce Willis ainda era 'o' cara e o elenco de apoio funciona. O que importa é que temos aqui mais um legítimo John McClane clássico, disparando frases de efeito, maníaco e desesperado, ainda assim rindo na cara da morte, como deve ser.

  Duro de Matar 2 está longe de ser uma sequência digna, ou de entrar para o hall das grandes sequências do cinema. Mas essa nem era sua pretensão. Foi apenas um filme grande feito com esmero para capitalizar em cima do sucesso do anterior, mas ainda assim respeitando todas as características que fizeram o clássico primeiro filme ser o que é. Não é um filme ruim, mas felizmente, na sequência que viria à seguir McClane voltaria com muito mais criatividade e trazendo à tiracolo o retorno de nosso diretor favorito para Duro de Matar, John McTiernan. O terceiro filme da série seria um novo Duro de Matar, original e com o espírito do primeiro.    

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Duro de Matar (Die Hard, Dir. John McTiernan, EUA, 1988, 114 min.)

  É engraçado dizer, mas minha memória de infância não mente: a única vez em que vi meu velho pai chorar foi ao final desta pequena obra-prima da ação chamada Duro de Matar, que John McTiernan dirigiu em 1988 sob um roteiro de Steven E.de Souza, e que transformou Bruce Willis em sinônimo de cool para toda uma geração de moleques que queriam ser ele e meninas que queriam ele. E tudo isso, meus amigos, é rock'n'roll paca.

  Se alguém lendo essa humilde resenha nunca assistiu Duro de Matar, recomendo que pare por aqui agora, compre, alugue, baixe, roube essa fita e volte aqui depois, ok? É uma experiência sensorial, um legítimo modelo de filme americano moderno de ação que gerou uma legião de imitadores...e acima de tudo, é um filme sobre um personagem que é muito durão, muito humano, e muito filho da puta, como todos nós somos: esse é um filme sobre John McClane.

  John McClane é um policial de Nova York absolutamente comum, como eu e você. Ele gosta de tomar umas biritas, é muito competente no seu trabalho, e tem uma montanha de defeitos...recentemente se divorciou de sua mulher, Holly Gennaro, que agora usa o nome de solteira, e secretamente pretende reconquistá-la. Porque McClane é um cara legal acima de tudo, e gosta de Holly. Ele apenas lamenta que os atalhos da vida tenham desviados ambos do caminho. E afinal de contas, é Natal, tempo em que todo mundo está disposto a perdoar os erros do passado e tentar vida nova. O que poderia dar errado?

  Na real, TUDO dá errado, e McClane vai à Los Angeles visitar Holly em uma festa de fim de ano no prédio onde ela trabalha, uma grande companhia....o prédio gigantesco é o Nakatomi Plaza. É uma festa cheia de chatos, louca e descontrolada como toda festa no final de ano numa empresa deve ser...mas McClane só quer Holly de volta, só quer recuperar seu passado e apagar seus erros de vez.

Eis que entra Hans Gruber, que graças ao gênio cênico de Alan Rickman se transforma em um dos vilões mais maquiavélicos, ardilosos, astutos e cruéis do cinema popular recente. Gruber e seus comparsas invadem o Nakatomi Plaza, sequestram todos os convidados da festa e exigem uma quantidade exorbitante de grana e outras exigências estapafúrdias para saírem de lá.

 Mas ei. Esses caras não contavam com John McClane.

E nas próximas duas horas o que segue é um jogo de gato e rato entre o policial sozinho de Nova York, acuado mas sempre um passo à frente dos bandidos, e o sequestrador implacável, que a cada novo plano revela mais duas reviravoltas, e assim por diante.

Parece bobo, eu sei. E olha, talvez o cinema de ação, aquele que começou com John Wayne e tá agora no Jason Statham, seja mesmo uma coisa meio boba, até infantil.

Mas Duro de Matar é o primeiro de uma linhagem, e John McClane incorporado por Willis é Bogart, é Wayne, é Roy Rogers, é Jerry Lewis, é Steve McQueen, tudo explodido no liquidificador e servido por John Mc Tiernan num coquetel absurdo de saraivadas de balas, lutas inconsequentes e as melhores frases de efeito da história dos filmes de ação.

O mais legal, o que sempre me faz voltar a esse filme é que seu herói não é indestrutível. Ele é vulnerável, muitas vezes comete erros, perde a cabeça...mas principalmente, ele age com o coração, porque a ex-mulher com quem ele quer reatar está sendo feita refém, e isso é um ótimo motivo. É toda a motivação que ele precisa. Esse filme é um anti-Stallone, Schwarzenegger, todos esses brutamontes oitentistas. Bruce Willis é a personificação do Blue Collar Guy, a definição americana de trabalhador comum, de homem do povo, de cara comum. E convenhamos, ver um cara comum pintar e bordar na cara dos malvadões é muito mais divertido.

Hoje parece fácil falar, porque é um modelo de filme que foi copiado demasiadamente, e como atesta a nova continuação que estréia sexta-feira (Duro de Matar 5 - Um Bom Dia Para Morrer), a própria franquia abraçou a auto-paródia. Mas nada tira a força desse primeiro filme, uma paulada de ação que influenciou gente como John Woo e Edgar Wright.

Se você precisa assistir um filme de ação americano autêntico, sem atravessadores, o filme a ser visto é Duro de Matar. Sem mais, o grande filme de ação dos últimos 30 anos.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

...ainda sobre Quentin Tarantino e 'Django Livre'

Enquanto seu Django Livre lota cinemas pelo mundo todo, ainda é possível dizer muita coisa sobre essa obra de Tarantino. Através do sucesso comercial e artístico confirma-se a habilidade inesgotável desse criador enquanto contador de histórias, como reciclador de gêneros.

 Encanta o Dr.Schultz (Waltz, um ator maior) á beira da fogueira, em 1847, contando para o recém-liberto Django (Jamie Foxx, enérgico e carismático no papel-título), sobre a analogia entre a busca de Django pela sua amada, Broomhilda, e a Broomhilda da lenda alemã, que é colocada no topo da montanha e submetida às dores do inferno até que seu amado Siegfried parta para o seu resgate. Tudo pelo amor, como bem são as lendas, e os filmes, e as histórias. Todos unificados, como que dando sentido à vida dentro da vida que os personagens de Tarantino vivem dentro de seus filmes.

 Maneira soberba de dizer, à moda tarantiniana, que o cinema, esse que conta sobre feitos heróicos e que encanta, sempre existiu, antes mesmo até da invenção do próprio cinema. Desde que haja alguém interessado em ouvir e outro interessado em contar, seja em frente à uma fogueira, usando as sombras como formas na parede de uma caverna, ou num cinema sofisticado, o que importa é a habilidade do contador em engajar sua platéia, em motivá-la o suficiente para que o final seja digno de ser testemunhado.

Em praticamente todos seus filmes os personagens fingem ser outro dentro do filme; a idéia de performance se junta à idéia maior de que em maior ou menor escala, em nossas vidas, todos nós em um momento ou outro interpretamos papéis com diferentes propósitos. Essa idéia é revolucionária porque evoca o teatro de Brecht e quebra com a idéia americana de estereótipo minimalista estabelecida. Mais ousado ainda, Tarantino se diz fanático por cinema de gênero e talvez até inconscientemente se torna um grande perversor de gêneros, com seus personagens que se perfazem pelo o que dizem ser e não pelo o que fazem. Essa é a grande contribuição dele, a cara do seu cinema, que não é sobre estereótipos, como dizem os caretas querendo parecer acelerados. Os tipos estabelecidos são usados como máscaras.

 E todo o cinema de Quentin me parece fundamentado nessa idéia de que o importante na base narrativa de um filme são os diálogos, coisa quase sempre dificílima de ser feita. Não existe uma convenção que dirija os personagens à um destino pré-estabelecido de estrutura básica de roteiro com três atos (ainda que vários de seus filmes apresentem essa estrutura, mais uma ousadia)...todos estão vulneráveis aos ventos da mudança. Essa imprevisibilidade é o que traz um frescor autêntico à sua obra. O sentimento de 'vale-tudo' é um trunfo no cinema controlado de hoje, em que vale a fórmula sobre a criação.Sua escrita me parece orgânica no sentido que respeita seus tipos peculiares ao mesmo tempo em que os conduz numa moldura de filme de gênero, de cinemão de rua dos anos 70 e 80. Mais uma vez, a convenção é usada como casca para uma subversão maior.

 É imensamente satisfatório ver idosos e jovens desfrutando do cinema de Tarantino com prazer insuspeito. As sessões de Django Livre que acompanhei são quase sempre acompanhadas de reverência, espanto e muitas risadas de prazer pela irreverência como esse cinema livre corre sem amarras, sem julgamentos e isento de recalques.  

 Desde Kill Bill, passando por Bastardos Inglórios e chegando agora ao excepcional Django Livre, esse autor constrói o que eu estou classificando como 'fantasias de vingança', que arrebentam com as amarras do gênero e criam verdadeiras experiências catárticas. Nunca faz parte do jogo a realidade ou a fidelidade histórica. O que vale é a satisfação prazerosa e irresponsável de ver um herói triunfar sobre chagas históricas. Em Bastardos...a justiça suprema era enfiar Hitler, Goebbels e cia. dentro de um cinema e matar todos eles. Aqui em Django...fica a supremacia de um herói negro que vence em última instância o racismo e consegue até influenciar em termos geracionais o futuro da linhagem dos heróis de ação do cinema, já que o sobrenome de Broomhilda é Von SHAFT, e Tarantino não esconde o prazer em citar nas entrevistas de divulgação que sua intenção também era fazer uma referência a criação do maior herói da Blackxploitation dos anos 70.

 A fascinação do cinéfilo por Tarantino não é difícil de ser compreendida: ele faz filmes populares, que congraçam ao mesmo tempo em que dividem, portanto geram discussão. Ao mesmo tempo consegue ser autoral e sempre ter a sorte de trabalhar com astros populares, o que ajuda na conquista do público neófito. E agora já entra em fase de colocar sua 'marca' dentro de gêneros, assim como Kubrick fez nos anos 80 com O Iluminado, Full Metal Jacket e seu último filme, De Olhos Bem Fechados. Ele já encontrou um viés seu para contar qualquer tipo de história, e isso é raro, raríssimo de se ver. Só espero que o público continue abraçando as ousadias dele e não o tenha como um sabor do momento, ou um simples transgressor. Tarantino é um dos grandes diretores americanos de todos os tempos, e filme à filme ele luta com garra por esse título. Não consigo lembrar de outro diretor com esse fôlego para com a própria obra e para surpreender o público médio de cinema. Que continue assim, até que outro moleque apaixonado por cinema tome respeitosamente (ou não) o seu lugar.