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sábado, 6 de agosto de 2011

Lenny (Lenny, EUA, 1974, 111 min.)

  Lenny Bruce era um iconoclasta. Briguento, despudorado, desbocado, provocador e ao mesmo tempo estranhamente afável... uma personalidade intrigante que só poderia render um filme bom como esse Lenny, filme de 1974 que só agora é lançado em dvd pela distribuidora Versátil no Brasil. Dirigido por Bob Fosse, diretor de obras como Cabaret e All That Jazz, o filme narra em tom documental parte da vida conturbada de um dos pioneiros do stand-up comedy nos EUA, cheia de reviravoltas e melancólica, haja visto que Lenny Bruce disparava absurdos em pleno palco em idos de 1960. Dá para imaginar o caos que o homem causou na ainda moralista América dos tempos de Kennedy.

  Pausa e aplauso para Dustin Hoffman, que aqui entrega uma de suas melhores atuações no papel do comediante. Alternando no início do filme momentos de euforia com outros da mais pura introspecção, Hoffman traz uma humanidade insuspeita para o personagem na primeira metade do filme. Quando Lenny começa a enfrentar o inferno dos tribunais e o vício em heroína, mais uma vez o ator surpreende ao retratar o comediante com vulnerabilidade e ao mesmo tempo, cada vez mais paranóico e defensivo, sempre procurando alvos e já dando vez a uma loucura melancólica, já que devido ao seu comportamento intempestivo, Lenny começa a ser ignorado e deixado de lado por produtores e donos de clubes de comédia por todo o país. De qualquer forma, é mais uma atuação imaculada de Hoffman, que fez dos anos 70 seu período mais fértil de manifestação criativa nas telas.

  O que a obra faz questão de deixar claro desde o início é que Lenny Bruce sempre foi um inconformado com a hipocrisia do ser humano. Quando se casa com uma belíssima stripper ( a estonteante Valerie Perrine, melhor atriz em Cannes pelo papel), vai apresentá-la à sua mãe, que não faz idéia da profissão que a futura nora exerce. Mas contanto que a mentira prevaleça, tudo é permitido. Quando a polícia o prende porque em um show proferiu a expressão cocksucker ( aqui algo próximo e abrandado ao termo 'boquete'), Lenny volta no próximo show com piadas muito mais ofensivas e de baixo calão, mas sem proferir uma única vez a mencionada palavra, e a polícia permite que o show prossiga. Como não era homem de concessões e sempre muito afiado nas observações do cotidiano, conforme o cerco social vai se instaurando e censurando sua persona, logo a verve cômica vai sendo deixada de lado em favor de críticas intermináveis ao sistema como um todo: religião, política, sociedade...nada ficava intacto ante a metralhadora giratória de Lenny Bruce.

  Seu fim foi triste como sua luta vazia nos palcos, inócua: morreu aos 40 anos, vítima de uma overdose de drogas. Se fica a idéia amarga de um homem que fez do riso amargo sua única válvula de escape contra um mundo que não suportava e vice-versa, também é possível ver aí um tipo desbocado e saudável em falta nos tempos atuais. Algumas de suas tiradas eram realmente observações acuradas sobre o cotidiano, e não é  difícil vê-lo como um poderoso cronista, um catador do nosso lixo moral. Como o próprio bem define à certa altura no filme: " Ei, isso não é um trabalho. Isso é necrofilia! Se as guerras acabassem e as pessoas fossem sinceras eu jamais estaria fazendo essa porcaria...eu me aproveito de tudo isso também!"

Um tipo de sinceridade que nunca estamos dispostos a encarar, não é mesmo? Grande filme!

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