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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Hesher (Hesher, EUA, 2011, 105 min.)

    Eu não fazia a mínima idéia do que esperar desse filme, Hesher. Digo, vem do circuito alternativo americano (o famigerado 'indie', que hoje é menos cinema independente e mais laboratório dos grandes estúdios) com boas críticas, elenco ótimo (Joseph Gordon-Levitt, Rainn Wilson e a recente academy award e prata da casa Natalie Portman), diretor estreante (Spencer Susser), mas razoavelmente conhecido no circuito dos festivais e roteiro assinado em parceria pelo próprio mais o diretor do filmaço australiano Reino Animal, David Michôd. Sem falar que é o tipo de filme que no Brasil, só se ganhar prêmio, senão...boa sorte na locadora. Então é aquela coisa: a gente vai ver esperando coisa boa, mas nunca se sabe.

   Eis que Hesher é espetacular. Um drama bem intencionado, uma história bem ao gosto americano: um coming-of-age movie, aquelas fitas que retratam o amadurecimento do protagonista ante momentos difíceis, mas definidores de caráter. É também um filme anti-preconceito potente e inesperado, pois a figura central, o desajustado Hesher, interpretado com gosto e todos os maneirismos à que tem direito por Gordon-Levitt, é o protótipo da figura desprezada pela sociedade: o 'metaleiro', rude, tosco, grosseiro, vândalo e sexista. Óbvio que desde a primeira cena já sabemos que o objetivo da obra é justamente desmistificar a figura e humanizá-la, mas seria clichê demais mostrar que por trás de uma cara de mau e tatuagens reside um sujeito triste, mas com coração de ouro. O roteiro pega o caminho mais difícil para definir o personagem, e funciona.

  Mas Hesher, o filme, é mesmo a história do menino T.J. (o excelente garoto Devin Brochu), que após a perda traumática da mãe passa a viver na casa da avó, que está muito doente mas não deixa de ser carinhosa e prestativa, e seu pai ,Forney (vivido pelo eterno Dwight do seriado The Office, Rainn Wilson, aqui em registro dramático provando que comediantes são sempre excelentes atores dramáticos), que desde a morte da esposa vive no inferno dos anti-depressivos entre o sofá e cama, praticamente um zumbi sem o menor poder de comando sobre seu filho, sobre a vida, enfim.

  O destino de T.J. é acordar, ir para a escola e diariamente ser humilhado por valentões. Essa rotina parece nunca mudar até que um dia o garoto esbarra em Hesher, o clássico metaleiro-bêbado-desbocado-pronto-para-brigar. Nasce aí uma estranha cumplicidade entre os dois, mas nada muito próximo de uma amizade convencional. Na verdade Hesher entra na família do garoto mais por uma passividade do pai e da avó, que permitem a entrada do estranho apenas por falta de força para reagir. Ainda há uma subtrama em que T.J. se apaixona por uma caixa de supermercado (Portman, em mais um desempenho notável), insatisfeita e saindo da adolescência, já pronta para se tornar uma mulher infeliz.

  Todos esses personagens sem rumo convergem para um desenlace levado muito à sério pelo diretor Spencer , que não cede à tentação de transformar o filme em um manual de auto-ajuda ou num espetáculo de redenção. Em Hesher, as pessoas cometem erros com consequências que perpassam as duas horas regulamentres de uma sessão de cinema. A dor do menino e seu pai não é banalizada. Hesher é um personagem do qual não se sabe muito, mas logo fica claro que sua suposta crueza no trato com o mundo nada mais é que uma defesa. Em momentos distintos, fica claro que sua opção de vida pode ter um motivo tão grave que nunca, ninguém, jamais saberá.

  É admirável um filme abordar a 'vida real' com tanta honestidade, sem oferecer soluções fáceis ou mensagens edificantes. Se há uma grande idéia em Hesher, é a do respeito ao próximo. Muitas vezes pensamos que temos o maior problema do mundo, que nenhuma vida pode ser pior que a nossa. Inúmeras vezes contamos aquilo que perdemos, e não prestamos atenção naquilo que ficou ali, ao nosso lado, esperando o devido reconhecimento. Felizmente, se olharmos com olhos de criança, ainda é possível mudar. Um filme puro, coisa rara nos dias de cinismo que correm. Não é pouco.

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