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sexta-feira, 24 de junho de 2011

Grandes Atores Vivos: Ricardo Darín

  Hoje esse blog presta homenagem a um dos maiores atores em atividade no mundo inteiro: Ricardo Darín.
Veterano de séries televisivas e de teatro no seu país natal, Argentina, Darín chamou a minha atenção no clássico Nove Rainhas, filme de 2000 que contava a saga de dois golpistas numa Buenos Aires que sofria diretamente os efeitos de uma grande crise econômica na virada do milênio. Lembro que assisti várias vezes, hipnotizado pelo ritmo, o roteiro afiado, as reviravoltas sensacionais; e principalmente me chamou a atenção o protagonista. Para nós, latino-americanos, Darín é a representação em celulóide daquilo que os americanos chamam de 'Blue Collar Guy' : o sujeito comum, da classe trabalhadora, que traduz no seu semblante e nos maneirismos o homem médio, que tem como objetivo viver com dignidade, sem nenhuma outra pretensão que seja.

 Na verdade a história de sucesso do cinema argentino no Brasil se confunde com a filmografia de Ricardo Darín: os grandes sucessos portenhos aclamados por crítica e público aqui são filmes em sua maioria protagonizados pelo ator. Quando trabalhava em videolocadora, lembro bem da empatia que as pessoas nutriam por seu nome. Darín se tornou sinônimo de qualidade, de cinema humano e bem-feito, preocupado em contar boas histórias. O Filho da Noiva, sucesso de 2003 dirigido por Juan José Campanella, foi recordista de público graças à uma premissa simples e imensamente sensível: contava a história de Rafael, quarentão em crise de meia-idade proprietário de um restaurante em Buenos Aires e responsável por seus pais já idosos. Ao mesmo tempo, tentava consertar sua vida amorosa, sempre em frangalhos. É uma fita sincera, dirigida com simplicidade por Campanella. Marca também a parceria cômica de Darín com seu velho parceiro de teatro Eduardo Blanco, ator excepcional que rodou em 2004 o igualmente bom Conversando Com Mamãe. De qualquer forma, seja no circuito de arte nos cinemas ou nas prateleiras das videolocadoras, O Filho da Noiva é indicação certa para aqueles que apreciam bom cinema.

 Vale a pena destacar as partcipações de Darín nos filmes XXY e Kamchatka, que fizeram grande sucesso nos circuitos alternativos e estão disponíveis para locação. Em 2004, reuniu-se novamente com Campanella no filme O Clube da Lua, mais uma vez coadjuvado por Eduardo Blanco na história sobre um centro comunitário prestes à desaparecer graças a cobiça e avareza de políticos locais. É um ótimo filme sobre ativismo, memória afetiva e os laços afetivos que nos acompanham desde a infãncia.

 Mas nada poderia preparar o mundo para o terceiro petardo da parceria Darín/Campanella: O Segredo dos Seus Olhos. Por falta de mais palavras, um filme perfeito. Uma mistura de suspense, drama e romance que rendeu o Oscar de Filme Estrangeiro a uma obra que nunca nos cansa de surpreender. É a crônica de um assassinato não-resolvido, de um amor não-realizado. É a história de Esposito, ex-funcionário público que ao se aposentar, decide escrever um livro sobre um assassinato ocorrido nos anos 70, nunca desvendado. Esse é apenas o início da montanha-russa de emoções que nos aguardam nesse que é, sem dúvida, o ponto alto da filmografia de todos os envolvidos nesse filme atemporal.

 Em 2010, Darín acertou novamente em Abutres, fantástico drama policial sobre um agente de seguros completamente amoral que forja acidentes com o consentimento de suas vítimas para conseguir dinheiro fácil, extorquido das seguradoras. Se apaixona por uma médica de ambulância que está na cena de um desses acidentes provocados por ele mesmo. É uma virada radical na carreira de Darín. Aqui ele compõe um sujeito mesquinho, solitário. Mas confere ao personagem uma humanidade excepcional. Sua parceira em cena é a excepcional Martina Gusman, de Leonera, dirigido por Pablo Trapero, grande diretor que também assina a direção e roteiro de Abutres. Um filme violento, desconcertante.

 O que nos leva à Um Conto Chinês, novo filme de Darín dirigido e roteirizado por Sebastián Borensztein. É um drama com toques cômicos excepcionais, cortesia de um roteiro fabuloso que fala sobre as chances que o destino nos dá e muitas vezes deixamos passar. Unindo a humanidade e a obsessão de Darín em construir um personagem que cativa pelo ativismo social, e um ar de coincidências absurdas que nos remete à Magnólia e O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, é com certeza um filme comercial que fará grande carreira nos cinemas e locadoras em todo o Brasil. Comento a obra em detalhes quando chegar ao Brasil, pois considero trapaça detalhar aqui um filme tão bom sabendo que o mesmo está, por enquanto, apenas disponível nos torrents da vida. É até uma outra discussão, mas fica aqui a ressalva: porque filmes tão bons que estão em cartaz num país bem ao lado, demoram tanto para chegar comercialmente no Brasil?
Será que só os blockbusters da vida merecem lançamentos simultâneos? Pensem: Darín já é muito conhecido no Brasil. Seus filmes precisam de distribuidores melhores, lançamentos mais rápidos, para que uma platéia cada vez maior possa apreciá-los.

 Enfim. Meu propósito hoje foi trazer aos leitores desse blog o conhecimento do trabalho fenomenal deste ator, que escolhe muito bem seus projetos e faz um cinema honesto, adulto e imensamente abrangente. Ricardo Darín é um dos vários responsáveis pelo mundo por trazer de volta a qualidade ao cinema popular. Vamos deixar essa rivalidade besta com nossos hermanos de lado e dar a mão à palmatória: Bravo, Darín!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Namorados Para Sempre ( Blue Valentine, EUA, 2010, 107 min.)

Que filme cheio de verdade esse Blue Valentine. Me recuso á chamá-lo pelo título nacional porque (A) não traduz o verdadeiro conteúdo da obra e (B) é apenas uma manobra comercial da distribuidora para faturar em cima de casais desavisados pensando se tratar de uma comédia romântica nos moldes de Sandra Bullock e congêneres. Esse provavelmente é o filme mais cruel e honesto que assisti nos últimos anos. É também uma belíssima crônica de um relacionamento fadado a destruição. Dirigido pelo documentarista Derek Cianfrance, Blue Valentine é o filme americano mais ousado dos últimos anos. Poucas vezes vi um diretor e um casal de atores demonstrar tamanha entrega na composição dos seus personagens. Ryan Gosling já havia me impressionado no extraordinário Half Nelson em 2006, e Michelle Williams é uma atriz capaz de abarcar várias oitavas num gesto, num olhar. A química entre os dois é natural. A palavra aqui é naturalismo. Chega a lembrar filmes de Truffaut, Cassavetes principalmente. Uma câmera que parece estar sempre em busca do acaso espetacular, 'aquele' momento essencial para o cinema. Fotografia deslumbrante de Andrij Parekh.

Somos levados a testemunhar a trajetória amorosa completa de Dean (Gosling) e Cyntia (Williams). Não há muito o que dizer, a não ser que é um filme destinado a atingir o coração de qualquer pessoa que já se envolveu num relacionamento que não deu certo. É complicado dizer isso, mas é um filme que me deixou vulnerável, esculhambou mesmo. Hoje, sexta-feira, vai ser exibido no Cine Lupo, e sinceramente não sei se consigo encarar de novo. A coragem com a qual o diretor e sua equipe de roteiristas expressa a idéia de amor e desilusão é tão intensa que me assustou. Não é um filme fácil. Ao mesmo tempo, transborda humanidade. Não faz vilões. Não aponta culpados. É um elogio ao que nos faz humanos e ao mesmo tempo tão falhos. Uma fábula sobre os desvios da alma, sobre o que duas pessoas apaixonadas são capazes de fazer. Para o bem e para o mal.

 Recomendo com todas as minhas forças essa pequena obra-prima, para aqueles que ainda se perguntam como conseguem manter um relacionamento à dois. Ou os que conseguiram estragar uma coisa perfeita. Tem também os que estão no céu azul da relação amorosa, e vivem se perguntando quando o caldo irá entornar. Não importa. Blue Valentine prova que nunca há paz. Existem sim, alguns momentos de bonança, mas o resto, folks, é tempestade. Alguns se seguram e aguentam, outros caem no mar e se afogam. O melhor filme em cartaz, que não tenho coragem de ver novamente.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

O Exterminador do Futuro 2 (Terminator 2 - Judgment Day, EUA, 1991, 135 min.)

  Tem dias que a gente sente a nossa bateria descarregar. De repente, nada mais parece te empolgar igual quando você era um moleque. Hoje foi um dia assim. Por mais que eu assista um filme novo, eu sei que nada vai me agradar, nenhum filme ou música ou livro ou seja lá o que for vai me dar aquela sensação de euforia, de estar testemunhando um momento único da cultura popular. Hoje em dia a idéia de 'Filme-Evento' é tão calculada que antes do filme estrear no cinema dias antes a gente já sabe quase tudo sobre a obra. Uma banda tocando ao vivo hoje em dia no Brasil já não tem mais novidade: meses antes, de ingresso já comprado, fuçamos toda a internet para saber o setlist que vai ser tocado. Assistimos vídeos no YouTube. Basta o dia chegar e pronto, a apresentação é exatamente a mesma que já estamos mastigando há muito tempo.

 Eu sei que é rabugice minha, eu sei. O ponto aqui é: ninguém vai tirar a minha infância e adolescência, os momentos sensacionais de descoberta desse verdadeiro manancial de conhecimento que a cultura popular (nunca gostei de 'pop') pôde me proporcionar. Cara, eu nunca, NUNCA vou esquecer o dia em que meus pais me levaram no Cine Santana, lá na Voluntários da Pátria, para ver esse que não é um filme, mas um marco na minha vida chamado O Exterminador do Futuro 2. O cinema ficava numa galeria, e lembro que o frequentávamos assiduamente, aos domingos. Ali assisti clássicos dos Trapalhões, um filme em que o Tom Hanks era policial e tinha um cachorro que agora não me lembro o nome, muitos desenhos animados da Disney, Ghost - Do Outro Lado da Vida, As Tartarugas Ninja, Rei por Acaso (filme ruim de John Goodman que quando moleque eu gostava muito!)...a lista era grande.

Mas naquele domingo a atmosfera era outra. Lembro que fomos em uma sessão tipo sete da noite, e a fila estava imensa. Fomos comprar os ingressos e nunca esqueci quando vi uma pessoa sendo retirada da sala de exibição numa maca! Uma confusão imensa. Meu pai negociou minha entrada com a moça da bilheteria, pois eu ainda tinha onze anos e a censura do filme era 14. Para completar, tive a visão do primeiro móbile de papelão que avistara em minha vida: um sujeito gigante, todo vestido de couro preto, óculos escuros numa motocicleta. Empunhando uma espingarda calibre 12. E por baixo dos óculos, um olho vermelho ficava piscando...era mais do que um moleque de onze anos podia aguentar. Eu nem sabia o que esperar.

 E aí, meus amigos, foi mítico. Uma sala completamente lotada. Mais de quinhentas pessoas vibrando e gritando, aplaudindo nos momentos certos. As perseguições insanas, os momentos de emoção genuína, Schwarzenegger quando era o maior astro de cinema do planeta, disparando frases que se tornaram domínio popular...lembro que olhava para os meus pais em êxtase. Quando o T-1000 se desfez em metal líquido pela primeira vez, o cinema veio abaixo. Ninguém ali estava preparado para isso. Os finais múltiplos, em que o monstro de metal líquido pinta e borda, se recusando a morrer. O epílogo arrasador, aquela trilha sonora que era o próprio anúncio do apocalipse. E Guns'n'Roses, claro. Aquela canção arrebatadora, 'You Could be Mine'.

 Saí do cinema mudado, sério. Eu, de alguma forma, iria fazer parte daquilo. Enquanto meu pai dirigia pela Cruzeiro do Sul rumo ao apartamento no Bom Retiro, eu olhava fixamente no vidro de trás, esperando que a qualquer momento o T-1000 pudesse estar correndo atrás do nosso carro. Nos dias que seguiram, eu desenhei centenas de historinhas que envolviam as cenas que eu havia visto no filme. Estranhamente, comecei a assistir tudo o que passava na televisão relacionado a ação e ficção científica. Comprava os jornais e revistas para saber qual seria o próximo filme de Schwarzenegger. Gibis eu já consumia centenas por mês, enlouquecia meus pais. Todas as referências, o pacote Cinema-Rock-Quadrinhos. Mais um moleque com a mente lavada pelo Tio Sam, diriam os ufanistas.

 Meses depois, nos mudamos para Araraquara, e uma das primeiras coisas que perguntei era onde ficava o cinema. Passando pela fachada do grande e extinto Cine Veneza, lá estava: O Exterminador do Futuro 2 ainda estava em cartaz aqui. E aí o filme saiu em VHS. E, sinceramente, eu assisti mais de cem vezes, no mínimo, desde o seu lançamento. É como um vírus. Toda vez que está na tv, eu assisto. Se algum amigo cita o filme, me dá vontade de assistir. Num dia como hoje, passados exatos 20 anos do seu lançamento, eu me pego assistindo e emocionado como sempre.

Tanta coisa mudou. Meus pais se separaram, Schwarzenegger virou governador, abandonou a carreira cinematográfica e agora se enrolou num caso extra-conjugal bizarro. Seus filmes não foram mais os mesmos. O Exterminador do Futuro ganhou duas sequências que nunca me empolgaram o bastante. James Cameron se tornou o rei deste e de outros mundos. Ed Furlong se afundou nas drogas e Robert Patrick até participou de Arquivo X! Linda Hamilton eu nem sei mais que fim levou. Minhas certezas se dissiparam ao longo do tempo, mas não posso ser mal agradecido. Em vinte anos, aprendi muitas coisas, conheci pessoas incríveis com quem posso compartilhar minhas paixões e gosto da vida que levo. Me considero afortunado por ter conhecido e visto tantas coisas bacanas. São elas que compensam os momentos ruins, barra-pesada mesmo.

 Mas é inevitável. A nostalgia é um traço da minha personalidade, e quando eu fico assim, meio melancólico, me perguntando onde diabos que minha paixão foi parar, eu assisto O Exterminador do Futuro 2. E aí tudo volta ao seu lugar, o mundo volta a fazer sentido. Eu me emociono, agradeço meus pais por me levarem para ver a obra que, no fim das contas, é a responsável pelo início do meu amor pelos filmes. E posso seguir em frente mais esperançoso, sabendo que algumas tempestades virão, mas que não posso sair da estrada.

 Sabe que é isso mesmo? O Exterminador do Futuro 2 é um filme sobre esperança, sobre fazer seu próprio destino, mesmo sabendo que todas as possibilidades estão contra você.

 Quando revejo esse filme aquele garoto de onze anos que estava embasbacado ao sair do cinema em 1991 sempre me lembra disso: "Ei, sempre há esperança! Vale a pena lutar!"

 É que as vezes o trintão aqui esquece. Obrigado Bruno, por me lembrar.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Foo Fighters: Back And Forth (EUA, 2011, 98 min.)

O que sempre me atraiu no conceito do rock'n'roll, desde sempre, é a idéia de honestidade. Você pode unir um grupo de pessoas completamente opostas, com níveis de habilidade diferentes, e no final uma música crua  e sincera será o resultado. É simples, meio barulhento e muito reconfortante. Não precisa de produção exagerada, só o sentimento certo.

E sentimento é o que transborda nesse ótimo documentário do diretor James Moll sobre uma das melhores bandas da atualidade, o Foo Fighters. É um filme direcionado á base de fãs da banda, mas que não exclui o leigo. Basta entrar na viagem sem preconceitos, e você verá um dos mais sinceros relatos sobre a dificuldade que é manter uma banda de rock. Sobretudo, Back and Forth é a saga de Dave Grohl, vocal/guitarra e bandleader que teve carreira brilhante como baterista das bandas Scream, Nirvana e recentemente no Queens of The Stone Age. Grohl deixa á mostra todas as cicatrizes de batalha, a luta de quem desde adolescente decidiu que queria tocar rock, seja num boteco para cinco pessoas ou num Wembley Stadium lotado com 80 mil pagantes. É ele quem relata que ser um rockstar não tem nada a ver com dinheiro ou fama. Para caras como ele, não havia outra opção. É o tipo de artista que nunca se comprometeu. Foo Fighters é uma rara banda atual que é conhecida no mundo todo e ao mesmo tempo ainda consegue resgatar o espírito do rock de garagem. Isso está mais do que provado no seu último disco, o sensacional Wasting Light, gravado por Grohl e seus asseclas numa garagem, em fita analógica. O resultado é espetacular, combinando as melodias grudentas características da banda com um estrondo sonoro muito bem-vindo.

Back and Forth passa por todas as fases do Foo Fighters, desde a gravação do primeiro álbum, que teve todos os instrumentos tocados por Grohl, passando pela quase dissolução da banda em 2003, devido a brigas entre os integrantes do grupo e o baterista Taylor Hawkins,que quase morreu numa overdose de heroína; e chegando ao início de 2011, quando o clima positivo entre os membros da banda possibilitou a reunião com o velho produtor Butch Vig para a gravação de Wasting Light.

É curioso como desde seu nascimento, o Foo Fighters evoluiu tanto no espectro de emoções retratadas por sua música. Amor, ódio, fé, coragem, medo, ansiedade, obstinação...todos esses sentimentos são retratados por Grohl sempre de forma leve, descompromissada. E ao mesmo tempo direto, sem exageros. É uma banda que passa meio despercebida de muita gente, talvez por repúdio à sua faceta descaradamente comercial e abrangente. Mas não confundam as coisas, folks: O Foo Fighters é uma banda que ousa ser simples e honesta em pleno 2011. Não é pouco.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Sobrenatural (Insidious, EUA, 2011, 98 min.)

  Sobrenatural é uma 'banana' dos criadores da série Jogos Mortais, James Wan e Leigh Whanell, para o subgênero que eles mesmos ajudaram a criar: o famigerado torture porn, que consistia apenas em violência gráfica explícita para gerar impacto de maneira canalha sobre a audiência. Há quem goste, mas meus amigos, isso não é cinema fantástico, não é terror, não é cinema mesmo. É um alento ver esses jovens cineastas preocupados em recuperar o senso de diversão nesse tipo de filme, e a aposta aqui foi na velha história da casa mal-assombrada: casal se muda para uma nova residência junto aos seus três filhos e subitamente passam a ser aterrorizados por aparições e outros acontecimentos que é melhor não revelar para não estragar a agradável surpresa que é esse ótimo filme. Sabiamente, Sobrenatural não se leva à sério, tem boas atuações de Patrick Wilson e Rose Byrne, e para uma produção que custou tão pouco para os padrões de Hollywood (1,5U$ Milhão), é excepcionalmente bem filmado, com trilha sonora perturbadora e uma edição enxuta que não perde tempo. Lembrando muito o clima do seriado Além da Imaginação, é um filme divertido, seco, direto, e despretensioso.


UM NOVO DESPERTAR (The Beaver, EUA, 2011, 90 min.)
 Sério, eu cresci assistindo filmes do Mel Gibson, então vou me abster sobre a vida pessoal do cara e todo esse circo que foi criado em parte por ele e em parte por curiosidade mórbida da mídia. O que posso dizer é que o velho Mad Mel está em grande forma sob a direção de sua amiga Jodie Foster em Um Novo Despertar, filme que conta a história de Walter Black, presidente de uma fábrica de brinquedos que, no auge de uma depressão que se arrasta por anos, é abandonado pela família, tenta o suicídio e vê como grande janela de comunicação com o mundo exterior um fantoche castor, que se torna um inusitado porta-voz. Jodie Foster, aqui em seu terceiro filme na direção, perde um pouco o rumo do filme confiando demais no carisma do ótimo elenco e deixando o roteiro fraco do estreante Kyle Killen ditar um ritmo estranho, meio capenga e que nunca detalha qual exatamente é a origem das fobias e patologias de Walter. Do jeito que está, Um Novo Despertar é um filme regular, mas que vai ser lembrado pela boa atuação de Gibson, como um homem tentando reencontrar seu lugar no mundo. Vale a pena ser visto, sem grandes expectativas.


A JOVEM RAINHA VITÓRIA (The Young Victoria, UK, 2009, 96 min.)
  Emily Blunt é uma mulher espetacular. Linda, talentosa e com carisma para dar e vender. Fiquei hipnotizado quando a conheci recentemente em Os Agentes do Destino, ficção com Matt Damon. Desde então tenho seguido os passos dessa deusa cinematográfica nascida na Inglaterra e que inicia uma promissora carreira. Nessa cinebio da rainha mais longeva da Grã-Bretanha, que surpreendeu muitos por sua iniciativa em ações sociais e por reivindicar sua independência amorosa, Blunt está deslumbrante. É a razão de ser do filme, que conta com a direção competente de Jean-Marc Valleé (diretor franco-canadense que fez antes o premiado Crazy- Loucos de Amor) e a produção discreta, mas decisiva de Martin Scorsese. Ótimo elenco de apoio contando com o eterno vilão Mark Strong, Paul Bettany, Jim Broadbent e Miranda Richardson. Não sei se é um filme que se destaca ante a tantas fitas históricas que pululam por aí, mas é digno e a beleza e o talento de Blunt certamente elevam a obra.

domingo, 19 de junho de 2011

Cedar Rapids (Cedar Rapids, EUA, 2011, 86 min.)

Constatação: Ed Helms é astro, um dos melhores nomes da comédia americana recente. Seja no estrondoso sucesso da série Se Beber, Não Case, em que faz o dentista ingênuo Stu, ou no seriado The Office, em que entrega toda semana gags hilárias na pele do genial Andy Bernard, Helms é mestre em retratar o americano médio comum, meio nerd, quase Forrest Gump, mas com uma alegria e uma energia que evoca a inocência dos filmes de Capra. Mas o fato é que Helms ainda precisava fazer "o" filme, aquele em que todas essas qualidades estariam à serviço de um bom roteiro e uma direção esperta o suficiente para fazê-lo brilhar ao lado de outros ótimos atores subestimados.

 E felizmente, esse filme é Cedar Rapids. Uma dramédia na melhor tradição Alexander Payne/Jim Taylor, destruindo mitos da seriedade e do bom-mocismo americanos ao mesmo tempo em que mostra um homem  inocente, vivendo uma vida tediosa prestes a passar por grandes reviravoltas éticas. Tim Lippe (Helms), é um corretor de seguros que tem um vida muito, muito pequena em Brown Valley, Wisconsin. Seu dia-a-dia consiste em atender seus fiéis clientes e agradar seu patrão Bill Krogstad (Stephen Root), que vê em Lippe o futuro da pequena empresa. Lippe ainda mantém um caso amoroso com sua antiga professora do colegial (!), vivida pela grande Sigourney Weaver, aqui em participação especial. Ao mesmo tempo que leva uma vida medíocre, Lippe tem um misto de inocência e melancolia que apenas as pessoas destinadas ao nada possuem.

 Mas as coisas mudam, e Lippe é enviado pelo seu patrão à Cedar Rapids, cidadezinha em Iowa onde ocorrerá uma convenção de corretores de seguros. Quase uma criança rumo a um mundo perigoso, Lippe leva toda a sua inexperiência à Cedar Rapids, faz amigos, descobre uma coisa ou duas sobre o amor, sobre os negócios e se mete em imensas roubadas. Falado assim, parece com um milhão de outros filmes, mas não é. Cedar Rapids tem personagens muito interessantes, e um olhar incomum sobre os 'losers' do sonho americano. Exemplo: O mestre John C.Reilly (ator favorito do diretor PT Anderson) interpreta Dean Ziegler, um corretor de seguros boca-suja, inconveniente, bêbado e...sincero. Ziegler se torna amigo de Lippe e como nas grandes amizades do cinema, dois caras tão opostos formam uma dupla genial. Ziegler é execrado por todos como um amoral, sujeito porcão e obsceno, mas existe uma simpatia no personagem defendido com bravura por Reilly que fica impossível não gostar toda vez que ele aparece em cena, falando absurdos e honrando o legado cômico de John Belushi. Grande momento de John C.Reilly. Joan (Anne Heche) e Ronald (Isaiah Whitlock) também são amizades que Lippe faz em Cedar Rapids, ambos completando um mosaico humano que completa essa jornada de Lippe, rumo a uma consciência maior da vida que o cerca e de como ficamos refém das amarras que impomos a nós mesmos sem perceber. A prostituta que Lippe conhece logo ao chegar na cidade é o maior exemplo disso: ao mesmo tempo em que Lippe não a reconhece como tal, tratando-a com doçura e lhe oferecendo um caramelo, a garota fica estupefata ao ver um homem que não a trata da maneira que está acostumada, e isso é o ponto central do filme: a imagem que as pessoas fazem de nós muitas vezes é bem diferente daquela que pensamos que projetamos.

Cedar Rapids é um filme sobre amadurecimento, auto-conhecimento e sobre viver sem julgar as pessoas. Em alguns momentos parece que vai descambar para uma comédia cínica, que vai apontar culpados, mas não. O mundo pode estar indo pelo ralo, e em nossa vida encontramos pessoas de todos os tipos. Mas é o que VOCÊ faz da SUA vida que importa no fim das contas. Tim Lippe, com seus olhos de criança sobre um mundo corrompido, viu isso e fez sua escolha. Talvez funcione. Grande filme.

Contra o Tempo (Source Code, EUA, 2011, 84 min.)

Se você é o tipo de pessoa que lê resenhas apenas para saber se vale a pena ver o filme, eu já entrego agora: Contra o Tempo é sensacional, é um dos melhores filmes de todos os tempos a usar o artifício de viagem no tempo e é eletrizante, 84 minutos precisos, enxutos, sem uma gordura; uma pancada certeira desferida pelo diretor Duncan Jones (filho de David Bowie que estreou na direção de longas em 2009 com a ótima ficção Lunar) e seus colaboradores, notadamente o roteirista Ben Ripley, que escreveu um roteiro praticamente perfeito sobre possibilidades perdidas, terrorismo, amor e aceitação, tudo isso numa embalagem de filme-pipoca para ser visto num cinema lotado, naquelas míticas matinês de sábado à tarde.

O argumento é relativamente simples: um soldado do exército americano, Colter Stevens, subitamente acorda no corpo de um desconhecido dentro de um trem rumo ao centro de Chicago. Sem revelar o grande barato do filme, esse homem faz parte de uma missão que tem como objetivo descobrir o culpado por um grande atentado terrorista que JÁ ACONTECEU, e isso é o estopim do projeto Código-Fonte, que permite uma pessoa viajar no tempo e ,dentro do corpo de outra pessoa que de fato estava no momento do incidente, possa viver apenas oito minutos através dos olhos desse desconhecido.

 E essa premissa é apenas o ponto de partida de um filme que 'empresta' idéias de centenas de outros exemplares do gênero, mas com um frescor que eu não via desde A Origem (Inception), a grande obra de Christopher Nolan que também divagava, de maneira originalíssima, sobre o mundo das possibilidades, das realidades alternativas. Em Contra o Tempo também há a preocupação de estabelecer um protagonista ciente das regras da ação, mas ainda assim capaz de possuir uma qualidade genuinamente humana, alguém com preocupações com as quais possamos nos identificar. Isso faz do herói alguém com uma cumplicidade muito maior com a platéia do que os superheróis tão distantes de nossa realidade que pululam por aí.

 Jake Gyllenhaal está em grande forma como Colter Stevens, expressando corretamente os sentimentos de um homem atordoado por não sabe o que está acontecendo ao mesmo tempo em que vai se tornando ciente de seu destino. Michelle Monaghan, linda e boa atriz, faz a mulher que se encontra no trem rumo ao desastre e estabelece um vínculo emocional com Colter Stevens que é o coração do filme. Vera Farmiga e Jeffrey Wright, ambos ótimos, completam o elenco como membros do projeto Código-Fonte que gradualmente vão liberando informações cruciais ao nosso herói, e consequentemente, nós, espectadores.

 O diretor Duncan Jones surpreende dirigindo o filme de forma limpa, sem maneirismos e sempre com um senso de ritmo essencial para a compreensão da obra. Lembrando um pouco a crueza de Paul Verhoeven em Robocop e Jan DeBont em Velocidade Máxima, Jones faz de Contra o Tempo um thriller sci-fi moderno, que durante sua projeção vai intensificando seu lado emocional e deixando de lado o velho clichê da bomba que precisa ser desarmada. Afinal, Colter Stevens tem um problema muito maior para resolver: descobrir quem ele é e onde ele está. Material de classe levado com competência por realizadores que entenderam que o bom cinema de ação não reside na proporção explosões-por-minuto, mas sim em um conceito sólido e um roteiro que nos faça ficar pensando dias depois de ver o filme. Nolan fez isso em Inception e Duncan Jones fez agora em Contra o Tempo, uma fita imperdível.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Inverno da Alma (Winter's Bone, EUA, 2010, 100 min.)

Inverno da Alma acompanha os passos de Ree (Jennifer Lawrence, em grande performance ), garota que cria sozinha seus irmãos em uma cabana nas montanhas Ozarks, estado americano do Missouri. O frio monumental serve de metáfora para comentar o estado psicológico e a violência física cujos personagens são submetidos. Ree precisa encontrar o pai, traficante de metanfetaminas libertado da prisão que sumiu, ou sua cabana será tomada pela polícia. Deve entregar seu pai vivo ou morto para garantir, de certo modo, a sobrevivência dela e dos irmãos. Para isso ela irá procurar em cada biboca, trailer, boteco sujo e casa suspeita por seu pai, afogado em relações pavorosas com os piores tipos da região. É ajudada a contragosto por seu tio, interpretado pelo fabuloso John Hawkes ( o balconista do boteco de beira de estrada em Um Drink no Inferno, aqui envelhecido e absolutamente assustador)...e falar mais estraga. Este filme é uma viagem ao coração da América drogada, depressiva e desvalorizada.

  E a escolha da obra em ser um estudo de situações e personagens em detrimento da ação propriamente dita faz muita diferença. Inverno da Alma curiosamente mostra um mundo em que as mulheres são muito fortes, e os homens sempre aparecem apagados, quando não ausentes ou mesquinhos. A menina Ree que durante o filme se torna uma mulher através de suas atitudes nos mostra que o abandono é uma faca de dois gumes. Ao longo do filme vemos a protagonista passar de aflita a curiosa e finalmente forte e obcecada em saber o que de fato aconteceu ao pai. E o mundo de homens que o tempo todo lhe confundem com respostas falsas, a eles o inferno do esquecimento está reservado. A diretora Debra Granik realça esse clima de abandono seja pela fotografia esmaecida, quase preto e branco, e pela trilha, um country de raiz americano que apenas aumenta a sensação de vastidão e desespero pelo qual a protagonista passa.

 A descida ao rio no final de Inverno da Alma pode ser muito bem comparada á descida de Martin Sheen ao rio onde Marlon Brando, doidaço, o encontra para a catarse final no épico Apocalypse Now. Em ambos os filmes, descer o rio significa ir de encontro ao limite da sanidade, ao fundo do poço onde os segredos mais escabrosos adormecem...a diferença é que enquanto no clássico de Coppola o Coronel Willard retorna com o júbilo pela morte justificada do maníaco Kurtz, aqui a menina Ree descobre o mal infligido ao seu pai. Mas não há redenção.

 Não importa. O que Inverno da Alma tem em comum com a obra de Joseph Conrad, O Coração das Trevas, é o retrato de uma pessoa que se assume uma gota d'água na pureza selvagem da América. A inocência que ruma em direção ao olho do furacão e não conquista mérito ou recompensa alguma por isso. A verdade violenta dessa América profunda que não diz, mata. Filme de uma sinceridade extraordinária.

I'm Back !!

  Meus caros, após um curto recesso devido a diversos problemas técnicos (aqui vai todo o meu amor para a Telefônica), estou de volta. Nesse intervalo curto de uma semana (uma década para os padrões atuais da internet) assisti vários filmes que compartilho aqui numa revisão rápida. Enjoy:

MEGAMENTE (Megamind, EUA, 2010, 85 min.)
Não vi essa nova animação da Dreamworks quando foi exibida nos cinemas no final do ano passado. Comprei o dvd e me arrependi muito, pois é um ótimo filme, uma distorção no velho mito do Superman, fazendo todas as referências a criação de Siegel e Shuster. É incrível como as animações estão sempre à frente dos filmes live-action. O roteiro é engraçado, as reviravoltas funcionam e a ação é sempre imaginativa, digna do que se espera de um filme desse tipo. Fala sobre um bebê , o último sobrevivente de um planeta que foi destruído (!), enviado pelos pais numa cápsula rumo à Terra (!!). A grande sacada do filme é que a cápsula cai numa prisão, e o bebê é criado por detentos...e se transforma no vilão Megamente(!!!). Não deixem de conferir.

KUNG-FU PANDA 2 (Kung-Fu Panda 2, EUA, 2011, 82 min.)
  ...e mais uma vez a Dreamworks se supera nessa continuação do primeiro filme de 2008. Não há muito o que se dizer, a não ser que o 3D poucas vezes foi usado com tanto brilhantismo, a história é emocional o suficiente para engajar o espectador e as sequências de luta são incríveis, dignas dos grandes filmes de artes marciais de todos os tempos. Numa busca pela sua identidade, Po enfrenta um novo inimigo que parece ter as respostas sobre o seu passado. Mas antes disso precisa impedir que ele domine toda a China, mate seus amigos e o Mestre Shifu. Rápido, sincero e divertidíssimo. Melhor que muito filme de 'gente grande' por aí.

OLHOS DE SERPENTE (Snake Eyes, EUA, 1998, 95 min.)
 ...esse é um filme do mestre Brian DePalma, na sua fase de grandes produções com astros e apoio dos estúdios em Hollywood. É também o auge do estrelato de Nicolas Cage, aqui abusando do seu estilo maluco de atuação, roubando todas as cenas em que aparece. Nunca o overacting foi tão bem utilizado na história do cinema por um ator como Cage, absolutamente ensandecido e fazendo caretas o tempo todo. É a história do assassinato de um grande político que ocorre durante uma grande luta de boxe. Cage e o amigo militar interpretado por Gary Sinise iniciam a investigação, que ocorre em tempo real. DePalma usa aqui todos os seus maneirismos: telas divididas, planos-sequência de grande duração (o inicial dura quase 15 minutos e é o grande momento do filme) e o uso do bom e velho MacGuffin, que vem direto da sua maior inspiração, Hitchcock. Longe de ser seu melhor filme, é entretenimento competente, mas perde força no final. Ainda resiste ao teste do tempo, e comprova como Nicolas Cage era legal nos anos 90!  

COM 007 SÓ SE VIVE DUAS VEZES (You Only Live Twice, EUA/UK, 1967, 117 min.)
...esse eu tirei do baú apenas porque li uma entrevista com o diretor de X-Men First Class, Matthew Vaughn, em que ele declarou que assistiu esse filme várias vezes para filmar o épico mutante. De fato, confere. Desde o plot, em que Bond (Sean Connery no auge) tem de enfrentar a organização Spectre, que pretende incitar uma guerra nuclear entre EUA e USSR, até o estilo de filmagem, sóbrio e cheio de ação, tudo remete ao filme dirigido por Vaughn. É só trocar Bond pelos X-Men e o vilão Blofeld por Sebastian Shaw e voilá! Temos mais uma releitura inspirada do cinema de ação dos anos 60. Dirigido por Lewis Gilbert, grande colaborador da série 007, o filme não perdeu o vigor por uma tacada de mestre do diretor: quase não há efeitos especiais mirabolantes no filme, o que visto hoje torna a experiência muito mais satisfatória e menos datada. Bom filme.

NEM TUDO É O QUE PARECE (Layer Cake, UK, 2005, 105 min.)
Esse é o primeiro filme dirigido pelo britânico Matthew Vaughn, egresso da publicidade que produziu os filmes de Guy Ritchie (Jogos, Trapaças, Dois canos Fumegantes e Snatch) e estreou nesse thriller criminal de maneira promissora, o que se comprovou nos posteriores Stardust, Kick-Ass e o atual X-Men First Class. Daniel Craig, aqui pré-James Bond, faz um traficante que tenta a ascensão nos círculos criminais da Inglaterra. Lembra muito o trabalho de Scorsese em Bons Companheiros e Os Infiltrados, mas com uma pegada inegavelmente britânica emprestada dos thrillers dos anos 70 estrelados por Michael Caine. Sou suspeito para falar porque sempre revejo esse filme: a energia da montagem, a trilha sonora e a temática do anti-herói movido pela mão fatalista do destino são destaques do filme que nunca canso de conferir. Tem uma cena-montagem monumental em que Craig está prestes a transar com a estonteante Sienna Miller ao som de Gimme Shelter dos Stones que é de cair o queixo. Recomendo com todas as minhas forças esse épico criminal britânico.  


...e assisti por último o superlativo Source Code, aqui no Brasil bestamente intitulado 'Contra O Tempo' ( título de um filme com o Jet Li de 2005!). Só que esse é bom demais para uma resenha curta, então já estou trabalhando no texto sobre esse filmaço do diretor Duncan Jones (Lunar). Em alguns momentos já posto aqui. Como diria Stan Lee: 'Nuff Said!

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Biutiful ( Biutiful, ESP, 2010, 143 min.)

Alejandro González Iñárritu é um dos melhores diretores de cinema da atualidade. Pode até ser exagero, eu sei, mas tem uma coisa nos filmes dele que chama a atenção: ele leva muito à sério o que faz. Ele não é cínico, não é leviano em relação ao ofício ou aos temas que aborda e para mim, isso é interessante. Desde Amores Perros, passando por 21 Gramas e Babel, eu percebo que o grande tema do cara é: gente. Isso mesmo, pessoas como eu e você. E eu ia guardar isso pra depois, mas já vou entregar agora: ninguém filma o acaso, o momento extraordinário no meio do caos como ele. Iñárritu é nascido no México, mas seus filmes não tem nada de dramalhão. Pelo contrário, o drama de Iñárritu é hardcore mesmo. Ele sabe as barras que as passoas comuns costumam passar, e consegue traduzir isso em filme de uma maneira maravilhosa. Suas narrativas fragmentadas não são mero artifício estilístico. É que a vida é realmente fragmentada! Quantas vezes começamos a conversar com uma pessoa, e o telefone toca, alguém toca a campainha, você precisa sair correndo, a gasolina do carro acaba no meio do caminho, falta água na sua casa, alguém inesperado chega em visita...as bifurcações são intermináveis, e sabemos bem que nosso dia-a-dia não é um episódio de sitcom, mas sim um épico monumental, o maior épico de todos, que dura muitos, muitos anos: o épico da SUA vida. Tem coisa mais importante, mais íntima que isso?

 Todo esse preâmbulo é uma tentativa falha de descrever o que eu sinto assistindo um filme monumental como esse Biutiful, a nova pedrada do diretor. A história , vista de soslaio, pode parecer banal: Uxbal, um homem com dom mediúnico, tenta criar seus dois filhos e se relacionar com a ex-mulher ao saber que tem câncer. Ao mesmo tempo sobrevive de bicos no submundo de Barcelona, trabalhando para a máfia chinesa.

 Pronto. Não é muito animador, certo? Mas tente olhar com um pouco mais de atenção. Mais perto. Mais um pouco. Preste atenção nos detalhes, nos olhares, naquilo que a câmera parece captar como que por acidente. Iñárritu e Javier Bardem, na atuação definitiva de sua carreira, nos convidam não apenas a assistir com distanciamento. Eles querem é que você sinta o que os persongaens estão sentindo: amor, ódio, decepção, ansiedade, medo, revolta. Você tem que entrar no olho do furacão, um carro de corrida á 300km/h, sem cinto de segurança, sem freios.

 O resultado disso é que eu saí do cinema, e agora revendo em dvd, destruído, arrasado. É esse tipo de sensação que eu quero de um cineasta hoje em dia. Perdoem o meu francês, mas puta merda, será que o mundo precisa mesmo de mais uma comédiazinha romântica canalha com a Julia Roberts? Como o cinema anda desonesto hoje em dia, como tudo está virando fórmula, estatística, filme de brinquedo...desculpem, estou me perdendo aqui. O que me espanta é a frieza de Iñárritu em colocar um espelho em nossa frente e mostrar todas as nossas facetas, da mais cruel à mais altruísta, mesmo que involuntária. Na tragédia é que a gente se une? Eu não sei, mas me dá gosto de ver uma dramaturgia que honra mais o legado de Plínio Marcos do que Dan Brown, e isso é um alívio.

 Em tempo: O 'Biutiful', escrito assim, com a grafia errada, se refere à beleza meio torta que a vida possui. O valor e a observação de que há beleza até nos erros. Isso está bem claro no filme: ao mesmo tempo em que Uxbal está deixando este mundo feio,cheio de dúvidas e incertezas, ainda existe a beleza a ser admirada nos olhos de uma criança, na beleza torta de sua mulher, numa revoada de passáros fenomenal que ocorre bem quando Uxbal recebe pelo celular uma péssima notícia.

Esse paradoxo reflete a qualidade do filme: existe a vida perfeita? Esse ideal americano que leva as pessoas à loucura num vale-tudo materialista para ver quem pode mais? Ou vale mais uma vida modesta, cheia de problemas, mas espiritualmente completa? Obrigado, Iñárritu, por me dar o benefício da dúvida. Você fez um filme 'Biutiful'.

terça-feira, 7 de junho de 2011

Liberdade Condicional ( Straight Time, EUA, 1978, 114 min.)

  Eddie Bunker sempre soube que a vida americana, como disse Fitzgerald, não tem segundo ato. Bandido profissional com QI acima da média, curtiu uma longa temporada atrás das grades. E outra. E outra. E mais outra. Daí então veio o insight: Eddie se tornaria um escritor, usando de toda sua experiência carcerária e criminal para produzir alguns dos romances policiais mais impressionantes da literatura americana. "Cão Come Cão", "Fábrica de Animais", "Educação de um Bandido". E "Nem os Mais Ferozes", praticamente uma autobiografia. A adaptação para cinema resultou neste grande filme com Dustin Hoffman no papel principal, "Liberdade Condicional", dirigido por Ulu Grosbard, aclamado diretor de teatro que foi assistente de Elia Kazan em "O Clamor do Sexo" e também de Robert Rossen em "Desafio à Corrupção". O roteiro cinematográfico foi adaptado por Bunker mais quatro colaboradores, entre eles um jovem chamado Michael Mann, que futuramente iria despontar autor de grandes fitas policiais como "Fogo Contra Fogo" ,"O Informante" e "Collateral". Com uma equipe dessas, não poderia dar errado mesmo. Até hoje é um filme cultuado por adoradores do gênero, entre eles Quentin Tarantino, que o usou como inspiração confessa para fazer o seu "Jackie Brown". Isso porque ainda em 1992, ele contratou o próprio Bunker para atuar como um dos bandidos, o Mr.Blue, em "Cães de Aluguel".

 "Liberdade Condicional" conta a história de Max Dembo, criminoso profissional especializado em assaltos à bancos e joalherias, libertado da prisão sob a tutela de um agente da condicional. Max pretende retomar a vida rotineira de maneira honesta. Mas o mundo mudou. E muita gente não vai deixar Max se enquadrar de volta tão facilmente. E daí para reencontrar velhos amigos e planejar um novo assalto, é um passo. Um movimento sem volta. Mesmo se envolvendo em um relacionamento amoroso, Max não pretende mais mudar de vida. Ele sabe que a sociedade já não o aceita mais. É essa crueza que faz do filme algo extraordinário. É a trajetória de Bunker, descrita no livro e adaptada sem amaciar o material.

O grande trunfo da obra é justamente o enfoque sem glamour da vida criminosa. Não é especialmente violento de uma maneira gráfica. A aspereza da vida, as relações desgastadas, o olhar seco e sem esperanças do protagonista carregam todo o peso do filme. Achei incrível o esforço em não tornar o crime espetacular, coisa que anos antes "Bonnie e Clyde" de Arthur Penn trataria de fazer: mostrar a vida fora-da-lei como uma Disneylândia do crime. Peckinpah também fez isso em seu "Os Implacáveis", mostrando Ali McGraw e Steve McQueen como o casal de bandidos mais sensuais já vistos até então. Grosbard evita isso escalando o brilhante Dustin Hoffman. Foi uma escolha de casting perfeita. Hoffman traz uma sensibilidade mundana inata para o papel. O seu Max Dembo é um homem que escolheu o crime como profissão, e o faz de acordo. Não há um pingo de carisma na composição de Hoffman. Gênio.

 Me impressiona nessa obra e em boa parte do cinema americano dos anos 70 a habilidade em contar histórias sem manipular acintosamente o espectador. Não raro, muitos filmes da época não tinham um final feliz. Acho de uma coragem tremenda diretores que ousam deixar o público sair de um filme com um nó na garganta, negando-lhes a boa e velha catarse. Talvez um amargor que se abateu sobre toda a produção artística do país devido à perda da inocência através das decepções políticas e sociais, o fato é que olhando com o distanciamento apropriado, entendemos hoje o frescor, a ousadia que esses filmes possuem.

 "Taxi Driver", "Um Estranho no Ninho", "Ensina-me a Viver", "Sem Destino", "A Última Sessão de Cinema", "O Poderoso Chefão", "Serpico"...todos estes são clássicos com a marca dessa fase criativa febril pela qual passou o cinema americano. Hoje esse post foi dedicado a "Liberdade Condicional", um pequeno clássico policial que merece ser visto e figurar ao lado dos acima citados. E afinal, como é bom descobrir um ótimo filme feito há mais de trinta anos, não? É sinal de que sempre é tempo de corrigir algumas injustiças.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Kick-Ass (Kick-Ass, Eua/UK, 2010, 112 min.)

Ah, o politicamente incorreto. Aquela instituição chatíssima que vez por outra serve de muleta para reacionários e retraídos destilarem todo o seu veneno contra um ou outro incauto que arrisca falar, fazer algo fora dos padrões estabelecidos. A ladainha é freqüente. Ouve-se muito " Se eu fizer isso, o que ELES vão pensar?", ou "ELES nunca me deixariam fazer isso num filme comercial". Sempre que eu ouço esse tipo de declaração, fico me perguntando: Quem são ELES? Que censura auto-imposta é essa que limita tudo a uma mediocridade tranqüila? Onde está o risco? E o humor negro? Aquele que é responsável pela humanidade ter sobrevivido até hoje aos grandes horrores da história. A charge no jornal que lava nossa alma , representando o inconsciente coletivo, o repúdio aos Grandes Bandidos de Colarinho Branco, esses sim vilões de fazer inveja a Thanos, Galactus, Coringa e Luthor juntos.

 O meu ponto é: CARETICE total esse povo que vê algo moralmente pervasivo e absurdamente violento em um filmaço como esse Kick-Ass. Li críticas de todo o tipo há um ano atrás, quando foi lançado nos cinemas. "Onde já se viu, uma menina de 12 anos vestida de Rambo e apanhando quase até a morte de um mafioso!", "...o tipo de filme irresponsável que incita a violência entre os jovens". Se toda essa turma que reclama da violência nos filmes em Hollywood se preocupasse mais com a violência real que reina por aí e exigisse mais dos governantes, já seria um grande avanço . Mas é aquilo: colocar a culpa no gringo pela tragédia local ainda é um costume feio de muito brasileiro. Não é minha intenção cair na armadilha e fazer o meu manifesto político aqui. Meu ponto é: como certo tipo de filme é subestimado pelo 'Joe Public', aquele tipo que vai no cinema e aluga filme querendo o mesmo arroz com feijão de sempre, ligando a TV, DvD, Blu-ray, o Home Theater; mas esquece de ligar o cérebro, peça tão importante.

 Kick-Ass é um filme muito avançado para a platéia que se destinou. Virou um cult. E assim como a história em quadrinhos na qual se basou, mostra a dicotomia entre ser um super-herói no comicbook, e no nosso famigerado mundinho real, onde você não tem superpoderes. Um osso quebrado te deixa dois meses engessado, um soco na boca e você fica parecendo um zumbi. Um tiro na cabeça é game over, sem ressureição dois meses depois com direito à capas variantes e minissérie de luxo. Kick-Ass ri do sonho adolescente, da fantasia de matar os bandidos, ganhar a garota e salvar o mundo.

Mas ao mesmo tempo, faz o elogio dessa inocência, uma fase tão boa da vida em que a gente não se toca dos perigos REAIS, aqueles que estão a um passo de distância quando colocamos o pé para fora da porta.

Mark Millar é o escocês maluco/gênio que bolou essa insanidade toda. Millar é um trintão como eu e provavelmente você que está lendo, suponho. Ele sabe que os sonhos de adolescência já passaram. Mas a paixão adquirida, não. Essa está lá, intacta. Essa emoção boa que temos lendo uma boa história bem escrita e desenhada, um filme de aventura espetacular, uma canção perfeita de três minutos...e é isso que Kick-Ass é, uma canção de três minutos redonda, irretocável. Uma sátira aos sonhos de outrora, aos ideais de heroísmo tão em baixa hoje...mas ao mesmo tempo um lembrete de que ainda dá para sonhar. Novos heróis ainda existem, mesmo que amorais e moldados aos novos tempos, bem menos românticos do que as eras de ouro e prata nos quadrinhos Marvel e DC. Vivemos em um mundo pós-Image. Os heróis são truculentos, assumidamente violentos. Mas o ideal está lá, intacto. Do jeitinho que Siegel e Shuster deixaram quando criaram o Homem-de-Aço. E lá se vão quase oitenta anos de sonhos.

 O filme honra todos esses ícones, faz reverência ao passado e ao futuro do cinema de ação, dos superheróis no cinema...e todos os códigos da minha juventude no cinema, estão todos lá: a máfia italiana que vem em linha direta dos filmes de Scorsese, a utopia deliciosa de salvar o dia e ficar com a garota é Homem-Aranha descarado; A violência cômica de Tarantino, a ação coreografada de Peckinpah e John Woo, a trilha que faz referência ao tema imortal do Superman escrito por John Williams. É muita coisa para citar.

 Revendo Kick-Ass hoje tive a certeza de que vivo no mesmo mundo que o criador da história Millar e o diretor Matthew Vaughn. Um mundo em que as pessoas sabem rir de si mesmas, de suas pretensões, de seus fracassos. Lugar de gente com humor sutil e refinado, que sabe a diferença entre paródia reverente e pastelão grosseiro. Meio utópico, eu sei. Mas com filmes como esse o caminho vai ficando menos sinuoso, e como eu disse no início, dá até para esquecer que ELES estão por ai, vomitando status quo e regras estúpidas.

domingo, 5 de junho de 2011

Hanna (Hanna, EUA, 2011, 100 min.)

   Hanna é um filme que evita o rótulo. Se pretende uma fita de ação/espionagem, mas em nome do desenvolvimento dos personagens, abraça uma história de ritos de passagem sobre Hanna(Saoirse Ronan), uma garota que desde recém-nascida, foi levada por seu pai, Erik (Eric Bana), um ex-agente fugitivo da CIA com o passado obscuro, para as florestas geladas da Finlândia sem nenhum contato com a civilização. Lá ele treina a jovem, praticamente a transformando numa ninja, imbatível no combate corpo-a-corpo e com um conhecimento intelectual superior as jovens de sua idade. Hanna é, e o filme sabiamente desenvolve isso nas sequências iniciais, uma máquina de matar preparada pelo pai, esperando o dia em que entrará em ação.

 E Hanna vai entrar em ação contra a agente da CIA Marissa (Cate Blanchett), que tem uma dívida de sangue com Erik e sabe do perigo que Hanna representa contra ela e numa conspiração maior que vai sendo revelada, junto com o passado de todos os personagens, no decorrer do filme.

 O diretor Joe Wright, egresso de dois filmes de época com estilo completamente diferente ( Orgulho e Preconceito e Desejo e Reparação), é a grande surpresa do projeto. É ele quem salva Hanna da vala comum dos filmes de ação pretensiosos pós-Bourne e faz do filme um banquete visual estupendo. Junto com o diretor de fotografia Alwin H. Kuchler, Wright nos brinda com um plano-sequência de quase cinco minutos em que Erik chega a Berlin e enfrenta os agentes de Marissa no metrô em um embate físico realista, violento e espetacular.Isso sem falar nas composições de extremo bom gosto, externando o psicológico dos personagens e sempre criando cenas de ação muito acima da média.

  Mas o filme entra num beco sem saída por culpa do roteiro esquemático, previsível. Hanna de fato contém dois filmes lutando entre si: um thriller de ação sem nada de novo e outro, esse sim muito mais interessante, sobre uma jovem garota no desabrochar da adolescência conhecendo um mundo que desde o berço lhe foi negado. Essas duas linhas narrativas são levadas com elegância pelo diretor Wright, mas é inegável que o ritmo do filme é muito prejudicado por essa variação de tons do filme. Resulta num híbrido esquisito, incomum, mas imensamente interessante. É um filme que emociona mais pelas interações entre os personagens do que pela ação em si, esparsa e genialmente orquestrada.

 Acho que o destino de Hanna é tornar-se um filme cult, daqueles que o grande público vai ignorar, mas com o tempo conquista um pequeno culto através do home vídeo e do boca-a-boca popular. Eu consigo ver o embrião de algo novo aqui, mas acho que ainda não foi dessa vez. Do jeito que está, é um filme regular. Com momentos de genialidade, mas que nunca engrena como deveria.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

X-Men: Primeira Classe (X-Men: First Class, EUA, 2011, 127min.)

Olha, é difícil dizer algo sobre um filme que você acabou de ver pela primeira vez e gostou muito. A empolgação fala mais alto, e é preciso colocar a cabeça no lugar e se ater apenas ao conteúdo bruto da obra. Afinal, emoção é, óbvio, uma coisa subjetiva e intrasferível.

Tudo isso para dizer que sim, meus amigos, X-Men First Class é sim o filme que eu esperava ver hoje. Mas também é muito mais que isso. Um pequeno milagre, um filme que eleva as adaptações de histórias em quadrinhos a outro patamar. Assim como Christopher Nolan fez com Batman, o diretor Matthew Vaughn deu uma nova roupagem aos personagens. Mas foi muito além: criou um elo duradouro com os filmes iniciais de Bryan Singer e acrescentou o seu estilo peculiar narrativo que já pôde ser conferido por quem assistiu seus filmes ( Layer Cake, Stardust e Kick-Ass). Esse filme faz Vaughn entrar, de maneira definitiva, no Clube dos Diretores Realmente Fodões. Não é exagero. Tudo estava contra ele. Os filmes anteriores, medíocres. O estúdio FOX, que o obrigou topar um cronograma maluco de filmagem ( Todo o processo foi realizado em menos de um ano).Os atores-ótimos, mas nenhum astro no elenco . Um filme anterior, Kick-Ass, difícil de se superar.

 Mas sim, meus amiguinhos. Vaughn fez o filme definitivo dos X-Men, aquele que junto com o segundo, vai ser lembrado como ponto alto da série. É o melhor filme que eu vi esse ano, fácil. E isso vai além de ser uma boa adaptação. X-Men First Class é um filme universal, que pode ser aproveitado por iniciados e leigos. Possui um roteiro espetacular, que apresenta os personagens, define o conflito, e parte para um clímax arrasador. Nem cabe falar aqui a história de um filme assim. É, acima de tudo, a história da amizade de Charles Xavier e Erik Lensherr, a formação da primeira equipe dos X-Men. Mas isso não faz jus a complexidade da obra. Ação, drama, romance, suspense...é um filme que abarca esses gêneros e faz um grande filme-pipoca, aquele que faz o cinema chacoalhar, o público torcer pelos protagonistas...é cinema popular no auge do seu poder de fascinar a platéia.

 Vou voltar aqui para falar mais coisas sobre o filme. Os atores estão perfeitos, a direção é precisa, sem falhas...mas acho que quanto mais se rever X-Men First Class melhor vai ser. O filme é uma coisa rara: ele não só dá sequência aos filmes anteriores da série, ele melhora os anteriores, ele dá mais substância ao que vimos anteriormente. É quase como que se os outros filmes conduzissem para esse aqui, o que é muito estranho. Não tem uma gordura, uma sobra sequer: o ritmo é atordoante, ainda assim conciliando a riqueza dos personagens, momentos de emoção genuína e um roteiro perfeito. Matthew Vaughn fez o filme de super-heróis definitivo aqui, lembrando obras como Os Incríveis, Homem-Aranha 2 e O Cavaleiro das Trevas como a definição do tipo de filme a ser alcançado neste gênero.

Bravo!

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Bravura Indômita (True Grit, EUA, 2010, 105 min.)

  Bravura Indômita é o remake do filme de 1969 com John Wayne e é dirigido pelos Irmãos Coen. E que prazer é assistir um filme desses diretores. Assim como Tarantino, Soderbergh e Fincher, os irmãos são daquela linhagem rara que fazem filmes com apelo comercial, mas sempre com conteúdo farto para discussões após a sessão. Mesmo sendo um remake, Bravura Indômita tem personalidade de sobra. É cinema clássico: bem executado e preocupado em usar uma história como ponto de partida para observação de costumes e comportamento humano.

É curioso como esse filme cresce absurdamente em revisão. Eu tinha visto no início do ano, no cinema, duas vezes, e já gostava muito dele. Ontem por alguma razão que me escapa captei leituras e idéias que me passaram despercebido nas primeiras vezes. O cinema dos irmãos é muito detalhado, demanda atenção, repetidas sessões...mas é extremamente gratificante. Nunca é chato, pelo contrário. Assim como faz Tarantino, os irmãos Coen devolvem a qualidade ao cinema de gênero,(aqui, no caso, o faroeste) e o fazem com absoluto domínio do ofício.

O filme conta a história de Mattie Ross (a estreante Hailie Steinfeld, roubando todas as cenas em que aparece),garota de 14 anos que busca vingar a morte de seu pai pelas mãos de Tom Chaney (Josh Brolin). A jovem garota contrata então um pistoleiro aposentado bêbado e errante: Reuben "Rooster" Cogburn (Jeff Bridges, espetacular) e ambos, acompanhados pelo Ranger Texano LaBeouf (Matt Damon), partem em busca de Chaney e seu bando.

A fotografia magnífica de Roger Deakins procura desmistificar o Velho Oeste, mostrando uma paleta de cores surrada, mas de extrema beleza. É a tradução perfeita da aridez, da secura. A trilha sonora de Carter Burwell, colaborador antigo dos irmãos, também tem poucos arroubos épicos. É discreta, melancólica, quase um epitáfio. E a edição dá um ritmo perfeito para o filme, cortesia dos irmãos sob o velho pseudônimo Roderick Jaynes.

 Todo esse aparato técnico é a ferramenta perfeita para os irmãos Coen deitarem e rolarem em sua subversão dos códigos e ícones do western: Logo nas cenas iniciais, quando uma locomotiva chega à cidade trazendo Mattie para reconhecer o corpo do seu pai, não vemos um plano heróico da máquina, como nos filmes de Ford e Leone; os Coen filmam a locomotiva de costas, chegando ao fim da estrada de ferro, uma maneira sutil de mostrar o metafórico 'fim da linha'. Todos os planos do filme contrariam a teoria de filmagem em que o 'herói' do filme, no caso Rooster Cogburn, teria de ser filmado de baixo para cima, ressaltando seu aspecto heróico. Cogburn é o anti-herói, e os irmãos fazem questão de demonstrar isso filmando-o sem reverencia, pois a verdadeira bravura do filme reside na jovem Mattie.

 Mattie é a garota no desabrochar da adolescência, dividida, após a perda do pai, entre dois ideais de masculinidade: o bruto, sujo e honrado, porém irracional, Cogburn e LaBeouf, que representa o ideal de homem racional e domado pelas convenções. É fácil perceber a quem o filme (e por consequencia, a jovem Mattie) faz o maior elogio: na apresentação de Cogburn, o vemos num tribunal dando um depoimento onde narra como matou três irmãos corsários sem pestanejar. Defende seu ideal, mesmo que torto, com uma firmeza inabalável. Já no primeiro diálogo com LaBeouf, Mattie o confunde com um palhaço de rodeio, o que dá a idéia do fascinante relacionamento entre esses três personagens tão bem desenvolvidos pelos irmãos Coen.

São em leituras como essa que percebemos a genialidade de determinados autores. Ao mesmo tempo em que fazem um faroeste perfeitamente palatável para o público que pretende apenas ver um filme popular de entretenimento, os irmãos Coen fazem também um incrível estudo sobre a força de uma mulher numa época em que esta era relegada ao segundo plano; ousam transformá-la em heroína e ainda fazem uma crônica sobre a decadência do herói em pleno 2011. Se isso não é ser subversivo, eu não sei mais o que é!  

quarta-feira, 1 de junho de 2011

O Homem ao Lado ( El Hombre De Al Lado, ARG, 2009, 100 min.)

De viagem relâmpago à São Paulo, passei um frio do cão e assisti esse filme argentino que chega por aqui tardiamente e confirma nossos hermanos como donos de um cinema cheio de estilo e principalmente com histórias capazes de engajar a platéia. Dava para ouvir uma agulha caindo na sessão do Reserva Cultural domingo à noite. Prova de que histórias simples e com forte componente humanista sempre encontram seu público. Gosto muito do cinema argentino e esse é mais um na lista de filmes fenomenais que se iniciaram lá nos anos 70, com A História Oficial, passando por filmaços como Nove Rainhas e o recente O Segredo dos Seus Olhos.

 O Homem ao Lado conta a história de Leonardo (Rafael Sprelgeburd), arquiteto que vive confortavelmente com a esposa e filha  em uma casa exuberante, a  única construída pelo célebre arquiteto francês Le Corbusier na América Latina. Leonardo vive exclusivamente da aparência do seu sucesso, coisa que o filme e suas composições certeiras fazem questão de demonstrar. Trabalho de fôlego da dupla de diretores Mariano Cohn e Gastón Duprat.

 Mas eis que um vizinho começa a abrir uma janela que dá direto para a casa de Leonardo. Esse homem, Victor (atuação espetacular de Daniel Araoz), é o oposto de Leonardo: machão, tosco, rude e também com o tipo de afabilidade que a classe social de Leonardo não conhece...Victor é um homem de verdade, sem rodeios. E não demora para Leonardo se revelar um personagem desagradável, um verdadeiro banana em suas tentativas para demover o vizinho da idéia de concretizar a famigerada janela.

  Esse é conflito que alimenta o filme. Aparentemente simples, mas que dá margens a muitas leituras, todas elas muito bem exploradas pelos diretores. A idéia da janela aberta por uma classe social menos abastada bem no quintal dos ricos é muito boa. Ao mesmo tempo em que se revela pouco sobre Victor justamente para se brincar com a nossa expectativa, cada cena envolvendo Leonardo o retrata como um homem triste, refém da própria riqueza conquistada. Refém de hábitos desnecessários e de pessoas que o tornaram, por assim dizer, não um homem humanizado, mas um homem soft. Um cara que apesar do conhecimento que possui, dos lugares que viu, da vida que vive é um sujeito que não sabe conversar de maneira racional com o próximo. Não consegue expor o seu raciocínio de maneira inteligível e, portanto, está condenado a ser um fracassado existencial. As poucas tentativas do personagem em se estabelecer como um homem racional na sua vida  mostram o quão patético ele é.

 E enquanto isso Victor vai vivendo sua vida, à sua maneira truculenta mas ao mesmo tempo inegavelmente simpático. Nada o abala em sua trajetória rumo a uma vida verdadeira, mas O Homem Do Lado reserva a esses dois arquétipos tão comuns em nossa vida moderna um destino absolutamente inesperado.

Sem tomar partido de qualquer um dos lados (e é isso que o filme é, uma astuta análise de classes), é sempre gratificante testemunhar um cinema tão rico em soluções humanas que faz a gente ficar pensando sobre a maneira como tratamos o nosso semelhante. O Homem ao Lado é um filme imperdível sobre comunicação...ou a falta dela.

X-Men Origens: Wolverine ( X-Men Origins: Wolverine, EUA, 2009, 102 min.)

E o caldo desandou de vez neste spin-off da série, X-Men Origens: Wolverine, que pretendia desvendar o passado do personagem mais famoso e com a história mais misteriosa dos X-Men .

 Ficou só na intenção mesmo, porque poucas vezes eu vi um filme desandar tanto no roteiro como esse aqui. De fato, após o X-Men 3 ter feito rios de dinheiro nas bilheterias, é claro que o estúdio FOX tinha a obrigação de continuar faturando com a série, mas a criatividade andou por baixo aqui. Revendo o filme agora percebo como é ruim. Hugh Jackman está fazendo ele mesmo, e não o mutante que encarnou de maneira brilhante nos dois primeiros filmes e no burocrático terceiro filme. Os atores estão péssimos, o roteiro é muito ruim ( Wolverine salvo por casal de velhinhos no meio-oeste americano? Ora, façam-me o favor!), e a direção estapafúrdia é do Sul-Africano Gavin Hood, que ganhou Oscar de filme estrangeiro por Tsotsi -Infância Perdida e foi contratado por capricho do astro Jackman, aqui no auge do estrelato e um dos cabeças do projeto. Hood claramente não sabe dirigir ação, caiu de pára-quedas na produção e nota-se que as poucas cenas de ação bem-sucedidas são mérito da direção de segunda unidade, a cargo de Peter McDonald que dirigiu, entre outros, Rambo 3. O efeitos de CGI são patéticos; imagine que as garras do Wolverine no filme de 2000 (!) são muito mais realistas do que as desse filme, claramente feitas de maneira apressada. A luta final com o suposto Deadpool é vergonhosa.

Os primeiros 40, 50 minutos de filme até que são digeríveis, mostram a saga de Wolverine dentro do projeto Arma X comandado por Stryker (vilão de X-Men 2 que aqui é reduzido a caras e bocas por Danny Huston), sua posterior saída do grupo de mercenários e a busca pela paz interior junto de sua amada, Silver Fox. A cena em que Silver Fox explica a origem do nome Wolverine é de uma vergonha alheia sem igual. Nada a ver com a origem dos quadrinhos e é mesmo coisa de novela mexicana. Não poderiam ter deixado isso passar, ficou horrível.

 Daí em diante, quando o irmão de Logan, Dentes-de-Sabre, (Liev Schriber pagando o aluguel) começa a matar os membros do grupo Arma X como chamariz para atrair a atenção de Wolverine, o filme perde o rumo e não se assume como uma palhaçada caricatural (como a aparição do Blob, horripilante), ou se é um filme que herda o manto da ficção séria estabelecida por Bryan Singer nos primeiros filmes da franquia. Na dúvida, jogam até o pobre do Gambit numa aparição desastrosa. O clímax com Dentes-de-Sabre e Wolverine lutando contra Deadpool no alto de um reator nuclear é, sério, uma das coisas mais idiotas que eu já presenciei. Quando vi pela primeira vez até passou, mas revendo agora dá para confirmar que esse filme é o fundo do poço cinematográfico dos X-Men, de onde parece que Matthew Vaughn e seu X-Men First Class vai nos resgatar.

E que sexta-feira eu possa esquecer esse filme ruim, evocar o mestre Stan Lee e dizer: Excelsior!

X-Men: O Confronto Final ( X-Men: The Last Stand, EUA, 2006, 98 min.)

Eis que após tudo o que Bryan Singer e sua equipe de colaboradores tiveram tanto trabalho para construir, o pasteleiro mais requisitado de Hollywood chega com sua sutileza de elefante em loja de cristais e põe tudo à perder. X-Men: O Confronto Final é um enorme passo para trás na série, e apesar de possuir boas idéias, sucumbe ante a mão pesada de Brett Ratner, apelidado carinhosamente por este escriba que vos fala por sua 'habilidade' em dirigir filmes rapidamente e sem deixar nenhuma marca autoral. O homem é um burocrata na pior acepção do termo. Ele não dirige filmes, ele faz produtos. Tudo bem que cinema é arte e também é indústria, mas vamos devagar né? Um pouquinho menos de ganância faria bem á todos os envolvidos aqui.

  Após uma dança das cadeiras de deixar qualquer fanboy pasmo ( um conluio entre Warner e Fox fez com que Singer saísse da franquia dos mutantes para ir dirigir Superman para a Warner, e Brett Ratner ,que estava confirmado na cadeira de diretor do filme...Superman, foi para a Fox dirigir...X-Men: O Confronto Final. Que bagunça, não?), o estúdio FOX, interessado em grana, mandou embora o outro pretendente à vaga, Matthew Vaughn , e ficou com Ratner, conhecido por sua habilidade insuspeita de dirigir filmes-produto e manter a produção no cronograma absurdo de filmagem. Ratner dirigiu, editou e finalizou este filme em SEIS MESES, prazo suicida que muito diretor com a cabeça no lugar jamais toparia. Não é à toa que Vaughn caiu fora, e agora voltou em 2011 para fazer o X-Men: First Class que estréia essa semana. Provavelmente a FOX viu a burrada que fez contratando um buroca para fazer esse filme e agora pretende recomeçar do jeito certo. Enfim.

  Por onde começar? Esse terceiro X-Men tem sim alguns acertos, mas todos eles são pela manutenção do trabalho de Singer. O estilo do filme, dos personagens, ainda tem débito com a caracterização certeira dos filmes anteriores, mas o roteiro rasteiro, as soluções bizarras e as mortes inexplicáveis fazem mesmo crer que por uma questão de tempo escasso e falta de imaginação, copiou-se o estilo de Singer e bola pra frente que a caixa registradora tem que tilintar, não é mesmo? Do jeito que está, X-Men 3 parece um Bryan Singer do Paraguai: Você tem a impressão que está assistindo um filme bom, mas aqui e ali pipocam indícios de que Ratner está no comando, passando com o trator por cima da sutileza e da inteligência dos filmes anteriores.

 Ao mesmo tempo que a história avança devido à descoberta da 'cura' do gene mutante, o filme mata de maneira equivocada três dos seus personagens centrais da trama, e o pior: não há impacto nenhum na história. O que se vê é ação e mais ação, sem a menor preocupação de fazer sentido. Sr.Ratner, X-Men não é isso. Ainda por cima resolveram socar a Saga da Fênix completa, que por si só daria mais uns três filmes, e a coisa toda vira um samba do mutante doido. Eu tenho a impressão que esse X-Men 3 é um amontoado de idéias reaproveitadas sem a menor inspiração, resumidas num filme de uma hora e meia. E o uso da sala de perigo, tão clássica nos quadrinhos e nos desenhos animados? Coisa triste. E outra: isso é um spoiler, mas eu preciso dizer, então se você por alguma razão não viu esse filme pode parar aqui. Por que diabos matar o Professor Xavier? E o Ciclope? E a Jean Grey? E porque o Wolverine mudou de personalidade e ficou bonzinho, virando o 'paizão' da Escola Xavier? Putz grila!

Mais uma coisa: que mania besta essa de querer resolver tudo em 'trilogia', não? Puxa vida, Star Trek tem vários filmes, James Bond tem mais de vinte filmes e os caras querem resolver uma cronologia que vinha se desenhando de maneira tão complexa por Singer num filminho desse e colocar o nome O Confronto Final só para ganhar uns trocos a mais? Mau, Fox, Mau! Pode ter dado dinheiro, mas perderam o prestígio dos fãs e da crítica.

X-Men 2 ( X2: United, EUA, 2003, 125 min.)

 X-Men 2 prova que o raio pode sim, cair duas vezes no mesmo lugar e com mais intensidade ainda! Com carta branca da FOX para fazer o que realmente queria após trabalhar sob restrições e entregar o primeiro bem-sucedido filme em 2000, Bryan Singer criou uma continuação que amarra todas as pontas soltas deixadas anteriormente e ainda estabelece várias linhas narrativas que se entrelaçam num clímax absurdamente sensacional. Em 2003, a Marvel ainda trouxe para as telas Demolidor e Hulk, mas foram os mutantes que arrebentaram a banca e fizeram de X2 o filme a ser batido da temporada.

Os roteiristas Dan Harris, Michael Dougherty e David Hayter usaram como base para o roteiro a Graphic Novel  'God Loves, Man Kills', escrita por Chris Claremont e desenhada por Brent Anderson, lançada por aqui em 1986 pela Editora Abril com o título 'O Conflito de Uma Raça'. Nessa história, conhecemos o Reverendo William Stryker, que cria um complô contra os X-Men e pretende banir a raça mutante do planeta. Adaptando livremente esse argumento, os roteiristas criaram uma história sólida que aprofunda ainda mais os X-Men no nosso mundo, usando acontecimentos como metáforas para situações políticas e de cunho humanista, como toda boa ficção científica deve ser.

 Fã de Star Trek há muito tempo, bem antes de sequer ser cogitado para dirigir X-Men, Bryan Singer fez o movimento certo ao trazer os heróis da Marvel para uma atmosfera mais realista. O que nas mãos de um diretor incompetente poderia ser apenas uma festa de efeitos especiais e ação descerebrada, com Singer ganha ares de ficção sofisticada, que vê a humanidade de manera crítica e sempre faz da ação uma extensão natural da história. X-Men 2 acaba sendo um filme sobre o que as pessoas são capazes de fazer quando se sentem amedrontadas, e o destaca o poder da comunicação, das alianças pelo bem comum em tempos difíceis.

 Falar mais é ser pedante. Quase dez anos depois do seu lançamento, o filme continua uma aventura arrasadora, com atuações perfeitas e entra no meu Top 5 de melhores adaptações de quadrinhos até hoje. Infelizmente a série tomou um rumo guiado apenas pela necessidade comercial, e aqui esse não foi o caso. X-Men 2 foi um filme comercial com qualidade, abrangente e sucesso de bilheteria. Quem dera os próximos filmes fossem assim.