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sexta-feira, 17 de junho de 2011

Inverno da Alma (Winter's Bone, EUA, 2010, 100 min.)

Inverno da Alma acompanha os passos de Ree (Jennifer Lawrence, em grande performance ), garota que cria sozinha seus irmãos em uma cabana nas montanhas Ozarks, estado americano do Missouri. O frio monumental serve de metáfora para comentar o estado psicológico e a violência física cujos personagens são submetidos. Ree precisa encontrar o pai, traficante de metanfetaminas libertado da prisão que sumiu, ou sua cabana será tomada pela polícia. Deve entregar seu pai vivo ou morto para garantir, de certo modo, a sobrevivência dela e dos irmãos. Para isso ela irá procurar em cada biboca, trailer, boteco sujo e casa suspeita por seu pai, afogado em relações pavorosas com os piores tipos da região. É ajudada a contragosto por seu tio, interpretado pelo fabuloso John Hawkes ( o balconista do boteco de beira de estrada em Um Drink no Inferno, aqui envelhecido e absolutamente assustador)...e falar mais estraga. Este filme é uma viagem ao coração da América drogada, depressiva e desvalorizada.

  E a escolha da obra em ser um estudo de situações e personagens em detrimento da ação propriamente dita faz muita diferença. Inverno da Alma curiosamente mostra um mundo em que as mulheres são muito fortes, e os homens sempre aparecem apagados, quando não ausentes ou mesquinhos. A menina Ree que durante o filme se torna uma mulher através de suas atitudes nos mostra que o abandono é uma faca de dois gumes. Ao longo do filme vemos a protagonista passar de aflita a curiosa e finalmente forte e obcecada em saber o que de fato aconteceu ao pai. E o mundo de homens que o tempo todo lhe confundem com respostas falsas, a eles o inferno do esquecimento está reservado. A diretora Debra Granik realça esse clima de abandono seja pela fotografia esmaecida, quase preto e branco, e pela trilha, um country de raiz americano que apenas aumenta a sensação de vastidão e desespero pelo qual a protagonista passa.

 A descida ao rio no final de Inverno da Alma pode ser muito bem comparada á descida de Martin Sheen ao rio onde Marlon Brando, doidaço, o encontra para a catarse final no épico Apocalypse Now. Em ambos os filmes, descer o rio significa ir de encontro ao limite da sanidade, ao fundo do poço onde os segredos mais escabrosos adormecem...a diferença é que enquanto no clássico de Coppola o Coronel Willard retorna com o júbilo pela morte justificada do maníaco Kurtz, aqui a menina Ree descobre o mal infligido ao seu pai. Mas não há redenção.

 Não importa. O que Inverno da Alma tem em comum com a obra de Joseph Conrad, O Coração das Trevas, é o retrato de uma pessoa que se assume uma gota d'água na pureza selvagem da América. A inocência que ruma em direção ao olho do furacão e não conquista mérito ou recompensa alguma por isso. A verdade violenta dessa América profunda que não diz, mata. Filme de uma sinceridade extraordinária.

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